Rodrigo Zani
Ciro vs. Caiado: A fragmentação da Direita e o caminho livre para Lula em 2026

A direita brasileira, que se manteve coesa durante o governo Bolsonaro sob a liderança carismática — e polarizadora — do ex-presidente, hoje parece à deriva. A recente troca de vetos entre o senador Ciro Nogueira (PP-PI) e o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), escancarou a crise de liderança e a fragmentação da oposição conservadora no Brasil. A disputa não é apenas simbólica: revela a ausência de um projeto político articulado, o enfraquecimento de suas lideranças e o vácuo deixado pela inelegibilidade de Bolsonaro.
Ronaldo Caiado, apesar de ser um nome tradicional na política brasileira, ainda encontra dificuldades em projetar sua imagem nacionalmente. Médico de formação, político combativo por vocação, Caiado foi protagonista na fundação da União Democrática Ruralista (UDR), nos anos 1980, e desde então marcou seu espaço na política como uma das vozes mais estridentes contra o PT e seus aliados. Ele já foi candidato à presidência da República em 1989, mas teve desempenho modesto. Ainda assim, durante décadas no Congresso Nacional, construiu uma reputação de conservador intransigente e articulador de embates memoráveis contra a esquerda, em especial contra o presidente Lula e seus governos.
Hoje, como governador de Goiás — um estado importante, mas ainda periférico no centro do debate político nacional — Caiado busca se apresentar como alternativa viável à sucessão presidencial de 2026. Entretanto, o desafio da visibilidade nacional persiste. Sua performance nas pesquisas eleitorais tem sido tímida, em parte porque a base conservadora ainda parece orbitando em torno de Bolsonaro ou de seu clã.
Do outro lado do ringue político, está Ciro Nogueira. Senador e comandante do Progressistas, Ciro é um dos grandes caciques do chamado "centrão". Ele foi ministro da Casa Civil no governo Bolsonaro, com quem se aliou de maneira pragmática, apesar de no passado tê-lo acusado de ser “fascista”. Esse tipo de recalibragem ideológica é comum no jogo político, mas cobra seu preço: a perda de credibilidade entre parte do eleitorado.
Hoje, Ciro vê sua própria reeleição para o Senado em risco. As pesquisas apontam para um cenário delicado no Piauí, seu reduto político. Para tentar manter influência nacional, Nogueira articula a federação entre Progressistas e União Brasil — um casamento forçado que não agrada a todos, especialmente a Ronaldo Caiado. O goiano parece não aceitar o papel secundário que lhe foi reservado nesse arranjo e, ao se ver rifado, partiu para o ataque.
Em resposta às movimentações de Ciro, Caiado foi à imprensa desqualificar o senador e reafirmar sua disposição em ser protagonista na construção de uma candidatura de direita em 2026. Em um gesto claro de insatisfação, declarou que quem fala por Bolsonaro não é Ciro, mas sim a família do ex-presidente, hoje desgastada e politicamente tóxica para segmentos mais moderados da direita e do centro.
A prisão domiciliar de Jair Bolsonaro, condenado pelo Supremo Tribunal Federal por tentativa de golpe de Estado, só agrava esse cenário. A direita segue acorrentada ao bolsonarismo, sem conseguir construir um novo nome ou um novo discurso capaz de conquistar o eleitorado fora do seu núcleo ideológico mais radical.
Caiado já cogita abandonar o União Brasil caso a federação com o PP inviabilize sua candidatura. Um dos caminhos ventilados é sua possível filiação ao Solidariedade, partido de Paulinho da Força, relator do projeto da anistia eleitoral — apresentado como dosimetria —, uma manobra que, ironicamente, revela como a velha política ainda dita os rumos da nova direita.
O impasse interno da direita brasileira favorece diretamente o projeto de reeleição de Lula. Enquanto os conservadores se engalfinham num jogo de veto mútuo, o governo federal avança em agendas populares, como a recente aprovação da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000,00 — aprovada por unanimidade no Congresso.
Em paralelo, Eduardo Bolsonaro, nos Estados Unidos, dá declarações cada vez mais desconectadas da realidade política nacional, aprofundando o fosso entre o bolsonarismo ideológico e o eleitor de centro, que poderia ser decisivo em 2026.
O que se vê, portanto, é uma direita fragmentada, sem norte e sem consenso. O veto mútuo entre Ciro Nogueira e Ronaldo Caiado é apenas o sintoma de uma crise maior: a incapacidade da oposição de se renovar, de apresentar um projeto unificado e de se libertar da sombra de Jair Bolsonaro.
Esse artigo opinativo não reflete necessariamente a opinião do portal Goiás 246.