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Estado de Goiás,19/10/2025

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    Rodrigo Zani

    A reconquista das ruas: O Brasil rompe o cerco da extrema direita


    A reconquista das ruas: O Brasil rompe o cerco da extrema direita


    Após anos de hegemonia da extrema direita nas ruas brasileiras, o povo voltou a ocupar os espaços públicos com um novo espírito democrático e plural. O que se viu recentemente nas avenidas do país — em especial na icônica Avenida Paulista — não foi apenas um protesto, mas uma reparação histórica. Uma reconexão entre o povo brasileiro e a rua como espaço legítimo de mobilização cívica.

    Esse reencontro não é repentino, tampouco desconectado do passado recente. Para entendê-lo, é necessário voltar a 2013, quando as manifestações começaram com o movimento estudantil, em São Paulo, protestando contra o aumento de 20 centavos na tarifa do transporte público. À época, os alvos eram o prefeito Fernando Haddad e o governador Geraldo Alckmin — ironicamente, hoje aliados políticos.

    Aqueles atos, embora inicialmente localizados, rapidamente ganharam dimensão nacional. Com a força das redes sociais e da cobertura midiática, transformaram-se em manifestações difusas contra a má qualidade dos serviços públicos. Era um grito legítimo por saúde, educação, transporte e dignidade. No entanto, esse grito foi manipulado. A operação Lava Jato, com apoio incondicional da mídia hegemônica, reconfigurou o foco das manifestações para uma agenda anticorrupção seletiva — que, ao invés de atingir todos os envolvidos em escândalos, canalizou a revolta contra os partidos de esquerda, especialmente o PT.

    Foi nesse vácuo de liderança e confiança nas instituições que a extrema direita ganhou terreno. Um deputado obscuro, do chamado baixo clero, viu a oportunidade de se apresentar como o "único político honesto". Com a ajuda de algoritmos, fake news, e o apoio simbólico da camisa da CBF, Jair Bolsonaro transformou-se em mito. O movimento apartidário das ruas foi capturado por um projeto de poder autoritário, regressivo e antidemocrático.

    Falo como alguém que viveu e participou das manifestações daquele período. Estive nas ruas em defesa de uma reforma política ampla, da ética na política e de punições justas a todos os envolvidos em corrupção. Contudo, vi com espanto e preocupação a guinada radical de parte do movimento. Em Brasília, testemunhei líderes reacionários assumindo os palanques, insuflando discursos de ódio e orientando as massas com intenções nitidamente eleitorais. Saí dali convicto de que aquilo não era mais uma mobilização cidadã, mas o início de um projeto autoritário.

    Com o tempo, esse projeto se consolidou. A eleição de Bolsonaro, em 2018, deu à extrema direita não apenas o Planalto, mas também as ruas. Vieram motociatas, passeios de jet ski e manifestações de cunho quase messiânico, onde a bandeira do Brasil era sequestrada para simbolizar uma agenda antidemocrática e militarizada. A corrupção — antes tema central — foi jogada para debaixo do tapete. O bolsonarismo, aliado ao centrão, passou a proteger seus próprios corruptos e, em troca de apoio no Congresso, passou a manobrar para garantir impunidade.

    O auge dessa deterioração institucional se deu com a tentativa de golpe de 8 de janeiro, herança direta dos anos de radicalização bolsonarista. A fuga de Eduardo Bolsonaro para os EUA e os apelos por intervenção estrangeira são partes de um roteiro vergonhoso que flerta com o entreguismo e trai princípios básicos da soberania nacional. Em um ato simbólico e revoltante, bolsonaristas chegaram a estender uma bandeira dos EUA na Avenida Paulista, demonstrando uma total falta de senso crítico e uma submissão inadmissível para qualquer patriota.

    Mas o Brasil começou a reagir.

    Recentemente, artistas, intelectuais, professores, lideranças políticas progressistas e até conservadores, além de milhares de cidadãos comuns, voltaram às ruas. Com uma bandeira do Brasil nas mãos, retomaram o símbolo nacional das mãos daqueles que a haviam sequestrado para propósitos autoritários. As manifestações foram massivas, plurais, pacíficas e democráticas. O recado foi claro: a democracia não pertence a um partido ou ideologia. Ela é patrimônio coletivo

    Chico Buarque, Gilberto Gil, Djavan e tantos outros nomes históricos da cultura brasileira juntaram suas vozes ao povo, repudiando manobras parlamentares que tentam, sob o pretexto da “anistia”, apagar crimes golpistas. A aliança do bolsonarismo com o centrão para blindar seus líderes é uma afronta à Constituição e uma ameaça direta ao Estado Democrático de Direito.

    O que se viu nas últimas manifestações é, portanto, mais do que uma resposta. É uma retomada. Um novo ciclo de mobilização social, mais consciente e menos suscetível às armadilhas do populismo autoritário.

    A democracia brasileira não está em negociação.

    Ela é fruto de décadas de lutas, de sangue, suor e esperança. E não será abalada por mitos de barro, nem por salvadores da pátria de ocasião. O povo brasileiro reencontrou sua voz, e agora sabe que ela deve ser usada para construir, não destruir; unir, não dividir.



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