Andressa da Silva Palmiro
Dismorfia financeira: a armadilha das redes sociais que distorce a relação com o dinheiro

Por Rebeca Andrade e Andressa Palmiro
Vivemos em uma era onde a comparação virou hábito — e nas finanças, isso também se tornou um problema. A pressão para atingir um padrão de vida idealizado, muitas vezes visto em redes sociais, faz com que muitas pessoas passem a consumir apenas para parecer bem-sucedidas, mesmo sem condições reais para isso. Essa desconexão entre a realidade financeira e o desejo de status tem um nome: dismorfia financeira.
O termo, popularizado pelo The New York Times, descreve um comportamento em que a pessoa perde a noção da própria realidade econômica, guiando suas decisões pelo que os outros aparentam ter. Ela passa a se ver como “pobre” diante de um cenário exagerado de abundância, mesmo que, objetivamente, tenha uma condição estável. O problema? Isso alimenta gastos impulsivos, endividamento e frustração constante.
Segundo a psicóloga Andressa Palmiro, esse fenômeno não é exclusivo das finanças. Assim como a dismorfia corporal, que envolve uma percepção distorcida do próprio corpo, a dismorfia financeira é caracterizada pela percepção distorcida da realidade financeira. A pessoa sente-se incapaz de reconhecer seus próprios recursos e, em vez disso, busca se adequar a um padrão que está além de suas possibilidades. O impacto emocional é profundo, pois a sensação de inadequação e a comparação constante levam a uma busca incessante por uma identidade financeira que não corresponde à sua realidade (SILVA, 2023).
Na versão financeira, a lógica é bastante similar à dismorfia corporal, mas aplicada à quantidade de recursos que se tem na conta bancária. A pessoa acredita ter o suficiente para viver bem, mas, ao olhar para as redes sociais, que amplificam essas comparações, ela passa a acreditar que está financeiramente atrás de todos os outros (SILVA, 2023).
A comparação é o combustível da dismorfia financeira. E, hoje, ela é turbinada por redes sociais que mostram uma vida recortada, com viagens, restaurantes caros, roupas de marca e conquistas profissionais, muitas vezes financiadas por crédito, heranças ou, simplesmente, encenações.
Esse fenômeno afeta principalmente jovens adultos, que estão em fase de construção de patrimônio. Ao se comparar com influenciadores ou colegas que parecem ter mais, passam a sentir que estão “para trás” na vida. A consequência
disso é a corrida por um padrão inalcançável, com base em métricas distorcidas, e não em objetivos reais e sustentáveis.
Neste contexto, a “comparação” assume um papel extremamente nocivo, criando a sensação de que se é inadequado ou insuficiente. O problema se agrava na era digital, onde a sensação de inadequação cresce exponencialmente. As redes sociais se tornam um palco onde as pessoas constroem pequenas ostentações, uma falsa imagem de que nada vai mal, ainda que, por dentro, o descontrole financeiro esteja presente.
A constante comparação nas redes sociais reflete diretamente na nossa visão de classe social e, muitas vezes, remodela o que de fato importa em nossa vida. Estamos vivendo um estilo de vida surreal. A ideia de riqueza que circula nas plataformas digitais faz com que até quem é de classe média comece a se sentir mais pobre, pois a rede social camufla a realidade e a vida real fica a sombra de uma versão idealizada e distante.
Ainda, segundo a psicóloga Andressa Palmiro, o impacto psicológico dessa dismorfia financeira é grande. A constante sensação de estar atrás dos outros pode levar a um ciclo de insatisfação e até depressão. O que se observa é que, ao invés de construir uma relação saudável com o dinheiro, o indivíduo se perde em um jogo de aparências e status (OLIVEIRA; SANTOS, 2024). Isso é especialmente prejudicial quando o indivíduo começa a tomar decisões financeiras impulsivas, que parecem estar em sintonia com o comportamento social, mas que na verdade são destrutivas (OLIVEIRA; SANTOS, 2024).
Dadosestatísticos
Segundo uma pesquisa do Bankrate e outra da Experian (EUA), 48% dos millennials sentem que estão financeiramente atrasados em relação aos colegas. Já um estudo da Morning Consult revelou que 57% dos jovens adultos dizem que o Instagram os faz sentir que precisam gastar mais para acompanhar os outros. Essa percepção de estar “para trás” em relação aos outros, alimentada por um consumo ostentatório, é uma questão cada vez mais recorrente entre os jovens adultos.
Por isso, é fundamental que tenhamos consciência da diferença entre realidade e aparência. Antes de acreditar que “só você não tem, não faz ou não é”, é necessário construir uma base sólida de comportamentos financeiros. Esses comportamentos funcionarão como um “norte” para quando o barulho da mídia digital começar a afetar suas decisões.
Entenda: esse mar de conteúdos da internet não atrapalha apenas seu viés financeiro, mas também o da perfeição por comparação.