Sob pressão, Hugo Motta desabafa e admite desgaste da Câmara em 2025
Reprodução Sob críticas que vão da esquerda à direita, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou a líderes partidários nesta semana que a Casa foi muito “machucada” ao longo de 2025. A declaração, feita em tom de desabafo, faz referência aos episódios de maior tensão enfrentados pelos parlamentares no primeiro ano de sua gestão.
Segundo relatos de três líderes presentes à reunião de terça-feira, Motta avaliou que todos os deputados sofreram reveses neste ano, cada um à sua maneira. A fala gerou manifestações de solidariedade entre aliados, que elogiaram a condução do parlamentar à frente da Câmara.
Nos bastidores, porém, o clima é mais crítico. Na reta final do ano legislativo, Motta passou a ser alvo de questionamentos tanto de governistas quanto da oposição. Deputados colocam em dúvida sua autoridade para comandar o plenário e avaliam que o primeiro ano de gestão foi abaixo do esperado, em comparação com o desempenho do antecessor, Arthur Lira (PP-AL).
A avaliação é compartilhada inclusive por aliados do presidente da Câmara, que reconhecem dificuldades na consolidação de sua liderança interna. Segundo esses interlocutores, Motta enfrentou uma sequência de crises institucionais que reduziram sua margem de manobra e o colocaram sob pressão simultânea do Palácio do Planalto, da oposição e do Supremo Tribunal Federal.
O desabafo ocorreu em meio a um ambiente político ainda tensionado. Nos últimos dias, a oposição intensificou as críticas à condução da Casa. O líder oposicionista Zucco (PL-RS) chegou a afirmar publicamente que o bloco perdeu a confiança na gestão de Motta. Aliados do presidente da Câmara veem o movimento como uma tentativa de pressioná-lo a assumir posições mais firmes contra o governo. Procurado, Motta não se manifestou.
Apesar do cenário, o grupo do parlamentar avalia que ainda há espaço para recomposição com o Executivo e o Supremo. Um aliado próximo afirma que Motta tem disposição para distensionar as relações institucionais e destaca seu perfil conciliador como um trunfo nesse processo.
A fala do presidente da Câmara ocorre em um momento em que sua autoridade é questionada por colegas. Ele foi eleito com apoio quase majoritário dos partidos e passou o ano tentando equilibrar demandas do PT, do presidente Lula, e do PL, do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Esse esforço, segundo líderes partidários, acabou gerando desgaste nos dois campos. O PL passou a cobrar gestos mais firmes contra o governo, enquanto setores da base governista passaram a desconfiar da disposição de Motta em sustentar pautas do Executivo diante de acenos ao bolsonarismo.
Na semana passada, o presidente da Câmara foi alvo de críticas da esquerda, da direita e do centrão após a não cassação dos mandatos de Glauber Braga (PSOL-RJ) e Carla Zambelli (PL-SP), além da aprovação do projeto que reduz penas para envolvidos nos ataques golpistas de 8 de janeiro. Zambelli, posteriormente, renunciou ao mandato em um movimento que contou com articulação de Motta.
As votações foram interpretadas como novos acenos ao bolsonarismo, ampliando o distanciamento da esquerda e gerando ruídos com o Palácio do Planalto — reforçando um clima de desconfiança mútua entre o governo e o presidente da Câmara.
Nos últimos dias, no entanto, lideranças do PT, do PSB e até do PSOL passaram a reduzir o tom das críticas. A avaliação é que um confronto aberto com Motta poderia dificultar a conclusão da agenda econômica do governo antes do recesso parlamentar.
Por outro lado, a cúpula da Câmara reclama do que considera ataques incentivados pelo Planalto ao Congresso, especialmente na campanha em defesa da agenda de justiça tributária, marcada pela retórica “nós contra eles”. Manifestações realizadas no último domingo tiveram o presidente da Câmara como um dos alvos.
Aliados citam avanço de projetos
Aliados de Motta afirmam que o parlamentar fez gestos relevantes ao governo ao assegurar a aprovação de matérias prioritárias nesta semana, como a conclusão da regulamentação da reforma tributária e o projeto que prevê corte de incentivos fiscais e aumento da tributação sobre bets e fintechs.
Esses avanços foram citados por governistas como sinais concretos de distensão após semanas de atrito. A leitura é que, ao garantir a entrega da pauta, Motta ganhou tempo para tentar recompor a relação de confiança com o Planalto.
O avanço das propostas contou com reforço na articulação política do governo, incluindo conversas diretas do presidente Lula e do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com o presidente da Câmara. Lula chegou a fazer declarações públicas elogiando Motta e negando desavenças.
"Sou amigo do Hugo Motta, do Arthur Lira, do [Rodrigo] Pacheco, do [Davi] Alcolumbre. Sou grato pelo que eles fizeram nesses três anos comigo. Na hora que surgir uma divergência, é importante a gente lembrar que precisamos conversar mais, aparar as arestas. Estou disposto a fazer isso porque nós somos gratos por tudo o que foi aprovado até agora." disse Lula nesta quarta, em reunião ministerial.
Um aliado próximo de Motta atribui o clima conturbado do fim de ano à necessidade de enfrentar temas considerados polêmicos, que estavam travando os trabalhos da Câmara. Segundo ele, 2026 deverá ser marcado pela construção de uma pauta positiva, com foco em projetos de segurança pública, como o projeto de lei antifacção e a PEC da Segurança, previstos para discussão após o recesso.
Nesse contexto, o aliado avalia que Motta ainda tem tempo para recompor a confiança com o governo federal. Ele também busca apoio de Lula para a candidatura de seu pai, o prefeito Nabor Wanderley (Republicanos-PB), ao Senado no próximo ano.
Outros dois aliados reconhecem as dificuldades enfrentadas em 2025, mas apontam como vitória recente a formação de um bloco parlamentar de centro, com 257 deputados — maioria da Casa —, que garantiria governabilidade ao presidente da Câmara.
Um deles avalia ainda que Motta precisará fazer uma escolha política em 2026, evitando o que chamou de “pingue-pongue” entre governo e oposição. Na visão desse aliado, o presidente da Câmara deverá, em algum momento, abraçar definitivamente o centro.