Renan acusa líder do governo de negociar avanço da dosimetria em troca de pauta econômica
reprodução O senador Renan Calheiros (MDB-AL) afirmou que o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), solicitou que a Casa deixasse avançar a votação do Projeto da Dosimetria — que reduz penas impostas a condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro — como parte de uma articulação para destravar a tramitação de um texto prioritário para a equipe econômica.
Segundo Renan, a proposta seria permitir o andamento da dosimetria em troca da votação, ainda antes do recesso, do projeto que corta incentivos fiscais e amplia a tributação sobre bets, fintechs e juros sobre capital próprio, medida estimada em cerca de R$ 20 bilhões de arrecadação adicional em 2026.
— Não é o governo. Quem falou comigo foi o líder do governo — afirmou Renan ao GLOBO. — O líder foi me pedir para deixar votar, em troca da votação das desonerações — completou.
A declaração ocorre em meio ao debate na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) sobre o relatório do senador Esperidião Amin (PP-SC), que busca restringir os efeitos do PL da Dosimetria aos crimes cometidos no contexto do 8 de janeiro e acolhe uma emenda do senador Sergio Moro (União-PR), classificada pelo relator como “emenda de redação”. O enquadramento é estratégico: permitiria que o texto fosse votado diretamente no Senado, sem retornar à Câmara, acelerando sua aprovação ainda em 2025.
Renan, no entanto, fez críticas duras ao mérito do relatório e à tentativa de tratar a emenda de Moro como meramente redacional. Para ele, a modificação altera substancialmente o conteúdo aprovado pelos deputados, o que inviabilizaria o rito acelerado.
— Essa emenda apresentada pelo senador Sergio Moro é uma emenda de mérito, não é uma emenda de redação. Ela fundamentalmente altera o projeto. Isso contamina tudo, verdadeiramente tudo — afirmou durante a sessão da CCJ.
O senador também rejeitou de forma explícita qualquer negociação política que vincule a dosimetria à agenda econômica do governo no Senado.
— Nós não podemos votar uma matéria dessa a toque de caixa. Esse projeto é um retrocesso institucional e jurídico sob qualquer perspectiva. Eu não vou participar de farsa nenhuma para possibilitar a votação dessa matéria para que o governo aprecie outra logo mais, à tarde, no plenário — disse.
A fala de Renan expõe a tensão crescente na reta final do ano legislativo. De um lado, há forte pressão de setores do Senado e da oposição para aprovar rapidamente o PL da Dosimetria, que pode reduzir de forma relevante o tempo de prisão de condenados por crimes contra o Estado Democrático de Direito. De outro, o governo tenta garantir a votação do pacote econômico recém-aprovado pela Câmara, tratado como essencial para o fechamento do Orçamento de 2026.
O texto fiscal foi aprovado pelos deputados na madrugada desta quarta-feira, após intensa negociação conduzida pelo Ministério da Fazenda, e chegou ao Senado cercado de expectativa e urgência. A tentativa de “casar” as duas pautas, no entanto, elevou o tom do debate e explicitou fissuras internas na base governista.