O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), intensificou nas últimas semanas as movimentações para reafirmar sua relevância política no momento em que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), se consolida como o principal elo do Congresso com o Palácio do Planalto.

No comando da Câmara desde fevereiro, Motta tenta recuperar terreno após o desgaste causado pela aprovação da PEC da Blindagem — proposta que criava barreiras para o julgamento de parlamentares e acabou sendo derrubada no Senado, após forte reação da sociedade.

Na época, o deputado defendeu o texto com o argumento de “proteger o livre exercício do mandato parlamentar”, mas não conseguiu evitar o desgaste. Em um episódio marcante, foi vaiado durante um evento com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Rio de Janeiro.

Desde então, Motta passou a investir em pautas de apelo popular e de impacto nas redes sociais como forma de reposicionar a Câmara. Entre as ações, aprovou a urgência do projeto que proíbe a cobrança de taxas por bagagens de mão em voos, classificando o custo como “abuso” das companhias aéreas. A proposta, do deputado Da Vitória (PP-ES), estabelece gratuidade para volumes de até dez quilos.

A medida, contudo, acabou sendo ofuscada pelo Senado, que se antecipou e aprovou um texto semelhante. Por tramitar em caráter terminativo na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o projeto segue direto para a Câmara. O autor é o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), que argumenta que a resolução da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) ainda permite brechas para cobranças adicionais.

Motta agora tenta costurar um acordo para que o projeto do Senado seja apensado ao da Câmara — ou seja, tramitarem juntos.

Segurança pública

A ofensiva também se estende à área da segurança pública, após Motta “limpar a pauta” e abrir espaço para temas de maior aceitação popular. Nos últimos meses, a Casa ficou paralisada pelos debates sobre a anistia dos envolvidos no 8 de janeiro de 2023 e, depois, pelo impasse em torno do PL da Dosimetria, que acabou sendo deixado de lado.

Em setembro, Motta aprovou a urgência de oito propostas que aumentam penas e criam novos tipos penais — entre elas, a que torna crime hediondo a falsificação de bebidas, após casos de intoxicação por metanol.

As votações foram acompanhadas de vídeos divulgados nas redes sociais, numa tentativa de se aproximar de um público mais amplo e se desvincular da imagem de político de bastidores.

Tanto governistas quanto oposicionistas avaliam que a fragilidade política de Motta o tem feito oscilar entre os lados. Eles citam votações como a urgência da anistia e a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil.

"Internamente, Hugo promove um ritmo produtivo e alivia tensões. E esses assuntos são as principais demandas da população.", disse o líder do PDT, Mário Heringer (MG).

Enquanto Motta busca maior visibilidade, Alcolumbre ampliou sua influência dentro do governo. O senador foi decisivo ao adiar a votação de vetos ao novo licenciamento ambiental — movimento que evitou uma derrota do Planalto e reforçou seu papel como fiador político de Lula no Legislativo.

Nas últimas semanas, Alcolumbre também participou de reuniões com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sobre o impasse na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2026.

Além disso, comemorou a autorização do Ibama para pesquisas de petróleo na Margem Equatorial, projeto que beneficia o Amapá e reforça sua imagem de articulador político no Senado.

Para o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues, não há conflito entre os presidentes, mas apenas uma diferença de trajetória e estilo.

"Não existe crise entre os dois. Motta é presidente pela primeira vez e Alcolumbre, pela terceira, além da diferença de idade entre eles. Davi já teve essa experiência de comandar antes.", afirmou.

Fantasma de Lira

Deputados do centro reconhecem que o Senado se tornou o principal polo de poder e avaliam que Motta tenta reagir. Diante da força de Alcolumbre e do risco de antecipação da eleição da Mesa Diretora, o paraibano busca manter a Câmara unida e afastar o fantasma do retorno antecipado do ex-presidente Arthur Lira (PP-AL), que ainda exerce influência nos bastidores.

Nos bastidores, há reclamações de que Motta ainda se deixa influenciar por Lira, pelo senador Ciro Nogueira (PP-PI) e por líderes próximos, como Doutor Luizinho (PP-RJ), Antonio Brito (PSD-BA) e Isnaldo Bulhões (MDB-AL).

Atento aos riscos, Motta tem procurado manter o diálogo com o Senado e adotar uma postura menos confrontadora, o que tem sido bem recebido pelo governo. O líder José Guimarães (PT-CE) elogiou o presidente da Câmara por colaborar com a votação de parte do pacote fiscal para destravar o Orçamento do próximo ano.

"O presidente Hugo Motta pediu que eu resolvesse isso. Ele tem ajudado a construir as soluções." disse o líder governista.

Aliados definem a atual condução de Motta como uma gestão de “baixo risco político”. Ele tem priorizado projetos de consenso, como o pacote da educação, que resultou na aprovação, em uma única sessão, de oito propostas unânimes — entre elas o piso de professores temporários e incentivos a estudantes de licenciatura.

Ao mesmo tempo, o deputado vem pressionando o governo por mais previsibilidade na liberação das emendas.

No Republicanos, aliados reconhecem que a PEC da Blindagem “deixou cicatriz” e exigiu uma reviravolta. A percepção é que o presidente da Câmara ainda busca um novo ponto de equilíbrio — entre a defesa da independência da Casa e a necessidade de reconstruir pontes, tanto internas quanto externas.