Deputados cobram reação de Motta ao Senado após rejeição da PEC da Blindagem

Deputados exigem do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), uma reação firme diante do que consideram uma quebra de acordo do Senado com a derrubada, por unanimidade, da PEC da Blindagem. A ausência de uma resposta mais dura, afirmam, coloca em risco a autoridade de Motta na liderança da Casa.
Líderes de grandes partidos e figuras importantes do centrão discutiram nos últimos dias possíveis respostas ao Senado, incluindo travar projetos de interesse dos senadores e atuar na CPI do INSS para direcionar investigações contra o Senado. Além disso, afirmam que o projeto de lei de redução das penas aos condenados pelos atos golpistas só avançará após uma concertação.
A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Blindagem, que condicionava a abertura de processos criminais contra congressistas a uma autorização do próprio Congresso, foi aprovada por 353 votos a 134, com empenho pessoal do presidente da Câmara.
Motta telefonou pessoalmente para deputados e mobilizou líderes de partidos aliados para apoiar o texto, afirmando que existia um acordo com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), de votar a matéria rapidamente.
Alcolumbre, no entanto, enviou o texto para discussão primeiro na Comissão de Constituição e Justiça, onde já vinha sendo criticado por parlamentares. O colegiado rejeitou a PEC por unanimidade. Interlocutores do presidente do Senado negam que tenha havido qualquer acordo sobre o tema.
O episódio gerou desgaste e críticas nas redes sociais contra os deputados que votaram a favor do projeto na Câmara, mobilizando milhares de pessoas em manifestações pelo país no último domingo (21), forçando parte dos deputados a pedirem desculpas aos eleitores.
Deputados reclamam que os senadores não só enterraram a proposta, como também criticaram abertamente os deputados e a Câmara, acusando-os de proteger bandidos. Nesse contexto, cobram que Motta se posicione em defesa da Casa.
Segundo deputados ouvidos pela Folha, o erro pode ter sido de Alcolumbre, por romper o acordo, ou de Motta, por pautar a PEC sem a garantia de que o Senado estava alinhado. De qualquer forma, acusam os senadores de se colocarem como bons-moços, mesmo com problemas de transparência e escândalos também na Câmara.
Como mostrou a Folha, o episódio enfraqueceu Motta e gerou dúvidas sobre sua autoridade dentro da Casa e com o Senado. Como fiador do acordo, caberia a Motta garantir seu cumprimento, segundo deputados. A derrubada da PEC causou desgaste às vésperas da eleição.
Quatro líderes afirmam que, daqui em diante, desconfiarão sempre que houver sinalização de acordos sobre projetos importantes. Defendem inclusive reuniões entre líderes da Câmara e do Senado em temas polêmicos, para evitar surpresas.
Nos bastidores, deputados dizem que a Câmara deve reagir de forma mais dura ao Senado. Ainda não foram definidos os projetos que podem ser afetados, mas o discurso é de que nada relevante para os senadores será votado com rapidez.
Os deputados também afirmam que vão insistir na quebra de sigilo sobre gabinetes do Senado visitados pelo lobista Antônio Carlos Camilo Antunes, apelidado de "Careca do INSS", acusado de ser um dos operadores de desvios no Instituto Nacional de Seguridade Social.
Alcolumbre proibiu a divulgação dessa informação para a CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito), alegando privacidade. Três integrantes da cúpula do centrão dizem que as bancadas serão orientadas a pressionar pela abertura desses dados e apresentar requerimentos que afetarão senadores.
Um aliado de Motta afirma que, se de fato houve um acordo, ele precisa tornar isso público para proteger os deputados. Lembra ainda que foram os deputados que o elegeram para a presidência da Câmara, e não Alcolumbre.
Um interlocutor frequente de Motta, no entanto, diz que ele não fará isso publicamente. Nesta quinta-feira (25), ao ser questionado, Motta disse que o Senado acompanhava a articulação para aprovar a PEC, mas negou que tenha havido traição.
"Não tem sentimento de traição nenhuma. Até porque temos a condição de saber que não obrigatoriamente uma Casa tem que concordar 100% com aquilo que a outra aprova. Já tivemos vários episódios em que o Senado discordou da Câmara e a Câmara discordou do Senado. Isso é natural da democracia e do funcionamento do Congresso", disse.
Dois aliados próximos a Motta afirmam que a relação dele com Alcolumbre também está estremecida. Desde que foram eleitos, em fevereiro, a relação era descrita como muito próxima – participaram de eventos e viagens institucionais juntos, além de manter contato quase diário.
Até a tarde de quinta-feira (24), aliados diziam que Alcolumbre sequer atendia às ligações de Motta. Na noite de quarta, participaram de um jantar em homenagem ao ministro do STF Luís Roberto Barroso, que deixou a presidência da Corte. Segundo participantes, eles interagiram e conversaram durante o evento.
O relator do projeto de redução de penas aos condenados pelos atos golpistas, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), afirma que há desconfiança de que a proposta seja aprovada na Câmara e depois engavetada no Senado, aumentando a resistência ao texto. "Não dá para pacificar o país se a Câmara e o Senado estão em guerra", disse.
Uma reunião para tratar do assunto estava marcada para quarta à noite, após o jantar com ministros do STF, mas Alcolumbre pediu para cancelá-la. Paulinho afirmou que tentará novamente na próxima semana, porque o projeto não avançará sem acordo com o Senado.