Golpe usava até call centers para descontos ilegais em aposentadorias

Metrópoles
Golpe usava até call centers para descontos ilegais em aposentadorias Reprodução

Um esquema bilionário de descontos indevidos nas aposentadorias do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), utilizava centrais de telemarketing para aplicar o golpe das mensalidades nos aposentados e também para atender as numerosas reclamações sobre cobranças que estavam sendo feitas diretamente na folha de pagamento dos benefícios, sem qualquer autorização dos segurados. 

Uma telefonista que atuou no atendimento aos aposentados associados a entidades suspeitas, funcionando como um SAC das fraudes, contou ao Metrópoles que era instruída por seus superiores a lidar com as queixas dos beneficiários prejudicados. Ela concordou em falar com a reportagem somente sob sigilo, temendo possíveis retaliações.

A funcionária mencionou que, em diversas ligações, os idosos afirmavam que estavam com os descontos nas aposentadorias há muito tempo, mas não tinham assinado nenhum contrato. Muitos desses descontos estavam sendo detectados pelos filhos dos aposentados.

“A gente tinha que falar para eles que [o processo de filiação] era feito por links de WhatsApp, ligações de telemarketing ou eles mesmos devem ter aceitado na hora que foram contratar a aposentadoria”, conta a funcionária. “Mas eles não sabiam, e a gente também que trabalhava lá, nem sabia que isso era uma fraude”, completa.

Até a deflagração da Operação Sem Desconto, realizada pela Polícia Federal (PF) em 23 de abril, ela atuava nas operadoras de telemarketing Callvox e Truetrust Call Center, que operavam no mesmo edifício em Brasília e contavam com centenas de funcionários. Um grande número deles foi contratado no final de 2023, período que coincidiu com o auge das irregularidades nos descontos.

Foi exatamente em dezembro de 2023 que o Metrópoles começou a publicar uma série de reportagens expondo as fraudes do INSS, que fundamentaram a grande operação da PF contra desvios que podem totalizar R$ 6,3 bilhões. O escândalo resultou nas demissões do presidente do instituto, Alessandro Stefanutto, e do ministro da Previdência, Carlos Lupi.


Call center do “Careca do INSS”

A Truetrust foi criada em junho de 2023 e entre os seus proprietários estão o lobista Antonio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “Careca do INSS”, e Domingos Sávio de Castro. Ambos são acusados de receber milhões de reais das organizações envolvidas nas fraudes e de pagar propinas a dirigentes do INSS por meio de empresas e familiares.

Além dos pagamentos ao ex-procurador do INSS Virgílio Oliveira Filho, a dupla também pagou o escritório de advocacia de Eric Fidelis, que é filho do ex-diretor de Benefícios do INSS, André Fidelis, responsável por assinar os acordos que viabilizaram os descontos. A razão social da Truetrust é ACDS Call Center, e a PF acredita que o nome derive das iniciais de "Antonio Carlos" e "Domingos Sávio".


SAC sobre fraudes  

De acordo com uma funcionária do call center entrevistada pelo Metrópoles, o responsável pelo atendimento diário na central é Adelino Rodrigues Junior, que possui procuração legal para atuar em nome da Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura (CBPA), uma das entidades sob investigação no esquema ilícito do INSS.  

Conhecido como Junior entre os colaboradores das empresas de telemarketing, ele foi responsável por efetuar pagamentos à esposa de um ex-procurador do INSS. Além dele, outras figuras, identificadas como gerentes de certas empresas de telemarketing, também estão sendo investigadas pela PF em conexão com transferências suspeitas.  

Os operadores recebiam orientações para atender aposentados que ligavam para as associações reclamando que não haviam consentido com os descontos em suas contas. O protocolo do Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) era padronizado para atender a várias entidades implicadas no esquema.


Roteiro mostra o que os funcionários deviam falar aos aposentados que notaram o desconto; Reprodução.


A orientação inicial para os aposentados era informá-los que o dinheiro seria restituído e solicitar um prazo de 10 dias para esse reembolso. A telefonista revela que, nos primeiros meses, alguns valores realmente foram devolvidos. Contudo, a partir de novembro de 2024, as instruções para os funcionários passaram a ser estender esse prazo para 20 e, depois, para 30 dias. Ela suspeita que, nesse período, as devoluções se tornaram menos frequentes.

Além de seguir o "roteiro", os atendentes dos call centers recebiam outras diretrizes, como mencionar que os descontos poderiam ser autorizados por filhos dos beneficiários ou através de um link enviado via WhatsApp.

Os funcionários eram organizados em grupos de aproximadamente 20 para atender às associações. A telefonista cita pelo menos três entidades que estão sob investigação da Polícia Federal: CBPA, a Associação Brasileira dos Contribuintes do Regime Geral de Previdência Social (Abrasprev) e a Associação Brasileira dos Aposentados e Pensionistas da Nação (Abapen).

A CBPA, por exemplo, não havia realizado nenhum desconto de aposentadoria até 2022, mas no ano seguinte, tornou-se uma das três entidades que mais aumentaram a arrecadação com cobranças de mensalidade, faturando R$ 57,8 milhões.

Tanto a Abrasprev quanto a Abapen foram mencionadas pela PF e foram excluídas da ação da Advocacia-Geral da União (AGU) que pleiteava o bloqueio de R$ 2,56 bilhões de 12 entidades que são alvo de um processo de responsabilização por suspeitas de pagamento de propina a diretores do INSS ou por serem entidades de fachada. A CBPA, por sua vez, é alvo da AGU.





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