Um terço dos municípios brasileiros termina o ano com dívidas e aponta risco de “bomba fiscal” para 2026
Reprodução Uma pesquisa da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), revela que cerca de um terço das cidades brasileiras está em atraso com fornecedores e não terá verbas suficientes para quitar despesas que serão transferidas para o próximo ano. O levantamento analisou a situação fiscal de 4.172 municípios, o equivalente a 75% do total de cidades do país.
O estudo foi realizado após o Congresso Nacional aprovar, em 2023, um adicional de 1% no Fundo de Participação dos Municípios (FPM), liberado todo mês de dezembro, justamente quando as prefeituras precisam pagar o 13º salário dos servidores públicos.
Dos municípios consultados, 1.202 (28,8%) afirmaram estar com pagamentos atrasados para fornecedores. Outros 2.858 (68,5%) estão em dia e 112 (2,7%) não responderam. Já em relação às despesas que ficarão para 2026 sem fonte de recurso suficiente, 1.293 cidades (31%) confirmaram que terão restos a pagar, enquanto 2.623 (62,9%) disseram não ter pendências e 256 (6,1%) não responderam.
Segundo a CNM, as prefeituras mantêm a folha de pagamento dos servidores em dia (98% relatam não ter atraso), mas enfrentam dificuldades para custear novos programas sociais e políticas públicas, muitos deles criados pelo governo federal e aprovados pelo Congresso Nacional sem garantia de recursos. Paulo Ziulkoski, presidente da CNM, destaca exemplos como o piso salarial dos enfermeiros, o programa Mais Médicos e a implantação de escolas em tempo integral. “O governo federal não para de criar pepino para os municípios, e os prefeitos aderem a isso. Não é o prefeito quem está sofrendo. Quem está pagando isso é a população mais pobre”, afirma Ziulkoski.
Entre os Estados, Minas Gerais lidera o número de cidades com pagamentos atrasados (196), seguido de São Paulo (168). O número de municípios sem dinheiro para pagar despesas em 2026 é de 213 em Minas, 192 em São Paulo e 114 no Rio Grande do Sul.
Em 2022, o Congresso aprovou uma PEC que proíbe a criação de novos programas sem garantir custeio para os municípios. No entanto, segundo a CNM, várias legislações têm flexibilizado essa exigência. “Todo esse impacto é muito grave. Isso vai se acumulando cada vez mais”, alerta Ziulkoski. “A arrecadação não aumenta muito, a despesa toda aumenta, muitos concedem aumentos sem condições de pagar e o maior impacto não é só no salário, é na previdência.”
Risco de “bomba” fiscal
Os municípios também apontam como ameaça futura a proposta aprovada no Senado que concede aposentadoria integral e paritária para agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias, com impacto estimado em R$ 69,9 bilhões.
“Como é véspera de eleição, qual parlamentar vai votar contra e perder voto? O pior é depois da eleição. O ano que vem alguma coisa vem, mas depois, em 2027, quem assumir a Presidência vai ter que fazer ajuste fiscal mais duro e aí terminou. E, para quem estiver no mandato com dois anos de prefeito, como é que vai fazer?”, questiona Ziulkoski.
A pesquisa também mostra que oito em cada dez gestores (80,2%) apontam a crise financeira e a falta de recursos como o principal desafio, seguidos por instabilidade política e econômica (67,5%), gestão na saúde (63,4%) e reajustes salariais (62,2%).
Recentemente, o Congresso aprovou uma PEC que limita o pagamento de precatórios pelos municípios conforme a arrecadação e promove renegociação das dívidas das prefeituras com a União. Apesar de ser um alívio, Ziulkoski afirma que não é suficiente para cobrir as novas despesas. A estratégia da CNM será tentar “segurar” o aumento de despesas no Congresso Nacional.