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Estado de Goiás,18/10/2025

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    STF julga criação de imposto sobre grandes fortunas

    Presidente da corte retoma ação que questiona omissão do Congresso desde 1988

    Folha de S. Paulo
    STF julga criação de imposto sobre grandes fortunas O ministro Edson Fachin assumiu a presidência do STF em 29 de setembro - Mateus Bonomi - 29.set.2025/REUTERS

    O STF (Supremo Tribunal Federal) deve analisar no próximo dia 23 se o Congresso descumpre a Constituição ao não criar uma lei que regulamente o IGF (Imposto sobre Grandes Fortunas). A inclusão do tema na pauta foi feita pelo ministro Edson Fachin, em uma das primeiras decisões após assumir a presidência da Corte, em 29 de setembro.

    Previsto na Constituição de 1988, o IGF é um tributo de competência da União, o que quer dizer que ele só pode ser criado pelo governo federal, e depende de lei complementar para começar a valer. A ideia é que ele incida sobre patrimônios de alto valor, como bens, aplicações financeiras e imóveis, acima de determinado limite.

    A Constituição autoriza sua criação, mas não define quem pagaria nem quais seriam as alíquotas — esses critérios teriam de ser fixados pelo Congresso.

    O caso que será julgado agora tem origem em uma ação do PSOL, a ADO (Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão) 55, apresentada em 2019. O partido pede o reconhecimento da omissão legislativa, ou seja, que o Supremo declare que o Congresso descumpre a Constituição ao não ter editado, até hoje, uma lei complementar para regulamentar o IGF.

    O PSOL argumenta que a Constituição determina sete impostos federais, dos quais apenas o sobre grandes fortunas ainda não foi regulamentado.

    Para o tributarista Alexandre Teixeira Jorge, do BBL Advogados, a não instituição do IGF não configura uma inconstitucionalidade, pois o exercício da competência tributária é uma faculdade, e não uma imposição.

    Mariana Pinheiro, advogada tributarista, também afirma que a ADO não tem potencial técnico para obrigar o Congresso a legislar, mas diz que a ação pode ser catalisadora do debate público.

    “Ela pressiona o sistema político a se posicionar diante da inércia histórica, elevando o custo político de continuar ignorando uma cláusula constitucional que, embora facultativa, está impregnada de legitimidade social”, afirma.

    Na prática, a procedência da ação abriria caminho para que o STF cobre do Legislativo que tome providências para elaborar a norma.

    O relator original da ação foi o ministro Marco Aurélio Mello, já aposentado, que havia votado pelo reconhecimento da omissão.

    O julgamento, iniciado em 2021 no plenário virtual, foi interrompido por um pedido de destaque feito pelo ministro Gilmar Mendes, e agora retorna à pauta do plenário físico, onde recomeçará do zero.

    Para os autores da ação, a ausência da regulamentação do IGF por mais de três décadas representa descumprimento de um dever constitucional. Para críticos, a regulamentação é uma escolha política do Congresso e não pode ser imposta pelo Judiciário.

    Essa não é a primeira vez que o tema chega ao STF. Em 2015, uma ação semelhante, a ADO 31, foi protocolada pelo então governador do Maranhão e atual ministro do STF, Flávio Dino. Na época, o Supremo sequer chegou a discutir o mérito da questão, entendendo que o autor não tinha legitimidade para apresentar a ação.

    O caso tem semelhanças com outras ações em que o Supremo decidiu diante da inércia legislativa, como no reconhecimento da homofobia como crime de racismo. Na ocasião, também houve o entendimento de que a omissão do Congresso impedia a eficácia plena da Constituição. Se seguir essa linha, a Corte pode determinar que o Legislativo tome providências para regulamentar o imposto.

    Além da importância fiscal e política do tema, o julgamento marca o início da gestão de Fachin com um sinal claro de disposição para enfrentar temas historicamente negligenciados pelo Congresso.

    A decisão pode ter efeitos apenas simbólicos, ao pressionar politicamente o Congresso, ou concretos, caso o STF fixe prazos para a aprovação da norma.

    O julgamento também deverá refletir divergências internas no tribunal sobre os limites da atuação judicial em matérias tradicionalmente legislativas.

    Do ponto de vista tributário, a eventual criação do imposto sobre grandes fortunas enfrenta desafios técnicos e políticos. A definição do que constitui uma “grande fortuna”, a base de cálculo, alíquotas e mecanismos de fiscalização são pontos que geram resistências.

    “Exige a definição de uma materialidade que não se confunda com a de outros tributos e de uma base de cálculo que não produza efeito confiscatório”, explica Teixeira Jorge.

    Segundo o advogado, há também questões operacionais relevantes, como avaliar se os custos de fiscalização compensariam a arrecadação potencial, dado que esse tipo de tributo costuma estimular a migração de domicílio fiscal e a retração de investimentos.

    Além disso, o tema mobiliza fortes reações no Congresso e em setores econômicos, especialmente por parte de parlamentares contrários à elevação da carga tributária sobre grandes patrimônios. Argumentos frequentes vão desde o risco de fuga de capitais até o impacto sobre investidores e empresários.

    Esse debate ganhou novo fôlego com a recente aprovação, na Câmara, do projeto que amplia a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000. O texto também prevê desconto no imposto para rendas entre R$ 5.000 e R$ 7.350 mensais. Como compensação, estabelece a criação de um imposto mínimo de 10% sobre a alta renda.

    A medida compensatória mira 141 mil contribuintes que, embora tenham rendas elevadas, recolhem em média apenas 2,5% de IR — menos do que pagam, proporcionalmente, policiais (9,8%) e professores (9,6%).

    A proposta busca compensar a desoneração da base da pirâmide e corrigir distorções históricas no sistema, que concentra a carga tributária sobre o trabalho e isenta lucros e dividendos. Ainda em tramitação no Senado, o projeto é apontado pelo governo como um passo rumo à justiça fiscal, mas conta com resistências de parte dos deputados.

    De acordo com Teixeira Jorge, a proposta de taxação mínima sobre a renda pode funcionar como uma alternativa mais eficiente ao imposto sobre grandes fortunas. Isso porque a tributação de renda, por ser dinâmica, tende a ser menos distorciva do que a incidência sobre o patrimônio, considerado estático e de difícil mensuração.

    Embora a tributação da alta renda venha ganhando espaço no Legislativo, a criação de um imposto específico sobre grandes fortunas nunca avançou no Brasil — mesmo em momentos de crise fiscal ou forte pressão por equilíbrio nas contas públicas.




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