Além de Trump, Brasil só foi citado pelos EUA duas vezes na Assembleia da ONU nos últimos cem anos

Antes da fala de Donald Trump na Assembleia Geral da ONU, na última terça-feira (23), o Brasil jamais havia ocupado tanto espaço no discurso de um presidente dos Estados Unidos durante a cúpula anual das Nações Unidas. Desde o início do século, líderes americanos haviam mencionado o país em apenas duas ocasiões e em contextos bem distintos do de Trump, que surpreendeu ao elogiar Lula ao mesmo tempo em que defendeu o tarifaço em resposta ao julgamento de Jair Bolsonaro.
A equipe do blog revisou os discursos de todos os presidentes americanos na Assembleia desde 2000 e constatou que, além de raras, as menções ao Brasil nunca incluíram referência direta ao presidente brasileiro – ainda que sem citar o nome –, o que torna a fala de Trump inédita.
Por cerca de um minuto e meio, o atual chefe da Casa Branca se dedicou a Lula e ao Brasil. De improviso, Trump contou ter encontrado o brasileiro nos bastidores e adiantou a possibilidade de um novo contato na semana seguinte – que, segundo o chanceler Mauro Vieira, deve ocorrer por telefone ou videoconferência. Ele chamou o petista de “bom homem”, disse que gostou dele e relatou terem tido uma “excelente química” em uma conversa de 39 segundos.
“Eu estava entrando [no plenário da Assembleia Geral] e o líder do Brasil estava saindo. Eu o vi, ele me viu, e nos abraçamos”, afirmou o republicano. “Na verdade, ele gostou de mim, eu gostei dele. Eu só faço negócios com pessoas de quem eu gosto. Quando eu não gosto, eu não gosto”, completou.
Histórico
Nas últimas 24 sessões da Assembleia, o Brasil só foi citado por Barack Obama, em 2012, e George W. Bush, em 2003. Foram menções protocolares e curtas, sem qualquer ligação com retaliações comerciais ao país e sem citar nominalmente Dilma Rousseff ou Lula, presidentes em exercício naqueles anos. O Brasil não foi mencionado nem por Joe Biden nem pelo primeiro mandato de Trump.
Obama, em sua fala, destacou o Brasil entre outros países como exemplo de redução da pobreza e crescimento econômico dentro dos princípios de direitos humanos e normas internacionais.
“Do Brasil à África do Sul, da Turquia à Coreia do Sul, passando pela Índia e a Indonésia, povos de diferentes raças, religiões e tradições tiraram milhões da pobreza ao mesmo tempo em que respeitaram os direitos de seus cidadãos e cumpriram suas responsabilidades enquanto nações”, declarou o democrata à época.
Bush, por sua vez, mencionou o Brasil ao lamentar a morte do diplomata Sérgio Vieira de Mello, então Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos, assassinado em um ataque contra a sede das Nações Unidas em Bagdá, no Iraque, em 2003.
Cotado para se tornar secretário-geral da entidade naquele período, Vieira de Mello havia estado com Bush na Casa Branca e fora designado pela ONU para atuar no Iraque com a concordância do republicano, mesmo diante de divergências públicas.
“No mês passado, terroristas trouxeram a guerra para as Nações Unidas. A sede da ONU em Bagdá representava ordem e compaixão. Por esse motivo, terroristas decidiram destruí-la. Entre as 22 pessoas assassinadas estava Sérgio Vieira de Mello. Ao longo de décadas, este bom e corajoso homem do Brasil levou ajuda aos aflitos em Bangladesh, Chipre, Moçambique, Líbano, Camboja, República Centro-Africana, Kosovo e o Timor Leste, e estava ajudando a população do Iraque neste momento de necessidade”, declarou Bush.
“Os EUA se juntam a vocês, colegas dele, nos esforços para honrar a memória de Sérgio Vieira de Mello e de todos aqueles que morreram junto dele a serviço das Nações Unidas”.
Conhecido pelo tom beligerante e pela imprevisibilidade em falas públicas, Trump também se destacou ao atacar antecessores, como nas críticas duras a Joe Biden. Além disso, fez o discurso mais extenso de um presidente americano na Assembleia: 55 minutos, quase quatro vezes o limite fixado pela ONU.
Com a citação improvisada sobre tarifas contra o Brasil, o republicano inovou novamente – rompendo, mais uma vez, com os protocolos diplomáticos.