Calote da Venezuela ao Brasil já dura sete anos e dívida supera R$ 10 bilhões


Calote da Venezuela ao Brasil já dura sete anos e dívida supera R$ 10 bilhões Reprodução

A dívida da Venezuela com o Brasil já supera R$ 10,3 bilhões e não há previsão de quitação. Desde que o país se tornou inadimplente, em 2018, os juros acumulados ultrapassam R$ 2,7 bilhões.

Os dados mais recentes são informações oficiais do Ministério da Fazenda, até 28 de fevereiro de 2025, e refletem os valores já pagos pela União em indenizações a bancos financiadores e os juros de mora acumulados.

Entretanto, o valor total pode ser muito maior. Estima-se que a dívida total gire entre US$ 1,7 bilhão e US$ 2,5 bilhões, ou o equivalente a quase R$ 12 bilhões na cotação atual (R$ 5,42 em 4 de julho).

O calote do regime de Nicolás Maduro envolve operações de crédito para exportações brasileiras, muitas delas vinculadas a obras de infraestrutura no país vizinho, como metrôs, estaleiros e siderúrgicas.

Os financiamentos foram garantidos pelo SCE (Seguro de Crédito à Exportação), respaldado no FGE (Fundo de Garantia à Exportação), um mecanismo operado pela União para assegurar o pagamento a exportadores brasileiros em casos de inadimplência dos países importadores.

“Todos os recursos foram desembolsados no Brasil, em reais, diretamente aos exportadores”, afirma o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

O banco destaca que as prestações não quitadas pela Venezuela “já foram integralmente indenizadas pelo SCE” e que o saldo devedor foi transferido à União. A última indenização foi efetuada em junho de 2025.

A dívida do governo da Venezuela com o Brasil, no entanto, continua a crescer. Apenas nos dois primeiros meses do ano, o estoque aumentou em R$ 960,78 milhões.

De acordo com o Ministério da Fazenda, isso ocorre tanto pelo não pagamento de parcelas cobertas pelo seguro — restando ainda quatro prestações a vencer até junho, ou seja, esse valor pode ser muito maior — quanto pela incidência de juros de mora, que continuarão a se acumular até a quitação.

A inadimplência da Venezuela com o Brasil começou formalmente em 2018, e a dívida remonta a financiamentos contratados desde o início dos anos 2000.

Os valores foram direcionados principalmente a operações de comércio exterior e infraestrutura, com apoio oficial do governo brasileiro.

Venezuela não responde às cobranças

Do total, cerca de US$ 1,5 bilhão está diretamente relacionado a grandes obras, como o metrô de Caracas. Com a inadimplência, o FGE cobriu os pagamentos aos bancos, mas a fatura recaiu sobre o Tesouro Nacional.

“O FGE cobriu grande parte desses pagamentos ao BNDES, transferindo a dívida para o Tesouro. Então, não é que o fundo supriu o problema, resolveu o problema com a Venezuela. Todos nós, cidadãos brasileiros, estamos pagando por essa dívida”, explica o professor de Relações Internacionais da UFF e pesquisador de Harvard Vitelio Brustolin.

“A Venezuela insiste em não responder às cobranças formais, nem resposta o Brasil tem. A negociação está totalmente suspensa”, complementa.

Em resposta a um requerimento de informações do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) enviado ao Ministério da Fazenda no início do ano, a pasta informou que a Venezuela tem sido cobrada formalmente por vias diplomáticas e comunicações diretas ao Ministério da Economia venezuelano.

“Diante da ausência de resposta das contrapartes venezuelanas, o processo de cobrança foi retomado com a cobrança periódica dos valores, incluindo os juros de mora, tanto por meio diplomático quanto por comunicações diretas ao Ministério da Economia venezuelano”, diz o texto assinado pela secretária de Assuntos Internacionais da Fazenda, Tatiana Rosito.

A Fazenda ainda ressalta que as dívidas venezuelanas com o Brasil também vêm sendo reportadas a instituições multilaterais, como o Clube de Paris. No entanto, esse mecanismo é apenas consultivo.

Pela lei internacional, um país também não pode simplesmente perdoar a dívida, mas há possibilidade de reestruturação judicial da dívida. Contudo, as chances de sucesso são limitadas.

“Não vai ser fácil, porque a justiça venezuelana é controlada pelo regime [de Nicolás Maduro]. Existem também negociações bilaterais e acordos de cooperação, como discutido no acordo de cooperação e facilitação de investimentos, em 2023 e 2024. Mas não houve nenhum avanço. Existem ferramentas diplomáticas e jurídicas, mas a eficácia dessas ferramentas depende da disposição da Venezuela, que atualmente optou pelo silêncio”, avaliou Brustolin.

A Fazenda ainda esclareceu que não há prazo definido para o pagamento ou renegociação da dívida.

“A aplicação da mora representa uma penalidade: o valor da dívida será incrementado até a quitação ou renegociação. A resolução da questão depende do engajamento da contraparte, não sendo possível assim estimar um prazo para conclusão”, diz o documento.

Além do Brasil, a Venezuela acumula dívidas com outros credores internacionais.

Segundo Brustolin, o país deve cerca de US$ 20 bilhões à China e mais de US$ 60 bilhões à Rússia e detentores de bônus internacionais, muitos deles com pagamentos suspensos desde 2017.

Há também pendências regionais, como os acordos de fornecimento de petróleo a países caribenhos, incluindo Cuba e Haiti.

O BNDES reforçou que, conforme seus normativos internos, não pode conceder novos financiamentos a países em inadimplência.

A responsabilidade por negociar a recuperação do crédito externo da União está, desde o início de 2024, sob a alçada da Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda.

A relação política entre os governos brasileiro e venezuelano também passou por mudanças. Em 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendeu eleições livres na Venezuela, mas as condições de transparência não foram atendidas. Como resposta, o Brasil vetou a entrada da Venezuela no Brics, e o diálogo entre os países foi interrompido.

Perdão por investimentos

Em junho deste ano, durante uma viagem à França, o presidente Lula defendeu a troca de dívida “por desenvolvimento e emissão de [DES] Direitos Especiais de Saque” para mobilizar “recursos valiosos” a fim de proteger os oceanos.

O DES é um mecanismo criado e administrado pelo FMI (Fundo Monetário Internacional) desde 1969, com o objetivo de fortalecer economias em tempos de crises.

É constituído de uma cesta de moedas fortes (como dólar, libra e euro). Não gera dívidas, mas segue regras de pagamento estabelecidas pelo fundo.

No ano passado, Lula também defendeu a criação de um desenho multilateral para o perdão de dívidas de países em troca de investimentos em educação.

Em um artigo publicado no jornal O Globo, o chefe do Executivo brasileiro e a diretora-geral da Unesco, Audrey Azoulay, defenderam “a conversão da dívida em investimentos na educação”.

Segundo os cálculos deles, em 2022, os custos da dívida de diversas nações são comparados ao orçamento anual para financiar o país. A ideia é permitir que países de rendas mais baixas consigam sustentar sua própria população.




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