Comando militar descarta anistia e se distancia de discussões sobre 8/1

A avaliação dentro dos quartéis sugere que um julgamento que assegure o direito ao contraditório e à ampla defesa deve culminar na condenação de alguns oficiais, enquanto outros poderão ser absolvidos. A maior preocupação gira em torno do processo judicial contra militares acusados de participar de encontros com o tenente-coronel Mauro Cid, onde, conforme a PGR (Procuradoria-Geral da República), foram discutidas estratégias para pressionar chefes do Exército que eram contrários ao golpe de Estado.
Quatro dos acusados eram assistentes de generais do Alto Comando e tinham uma boa relação com as lideranças. Dentro do Exército, acredita-se que eles têm boas chances de serem absolvidos ao final do processo.
Por outro lado, uma anistia ampla e irrestrita poderia favorecer o general da reserva Mario Fernandes, que é acusado de ter planejado assassinatos de autoridades. Ele enviou mensagens com conteúdo golpista para o ex-chefe do Exército, Freire Gomes, no final de 2022, e uma punição contra Mario foi evitada por receios do comandante sobre como Jair Bolsonaro (PL) reagiria.
Essa anistia também beneficiaria o ex-ministro e general da reserva Walter Braga Netto, que propôs ataques a comandantes militares; o tenente-coronel Rafael Martins de Oliveira, suspeito de vigiar o ministro Alexandre de Moraes em uma operação militar clandestina; e o coronel José Placídio dos Santos, que foi condenado por incitar a insubordinação dentro do Exército.
A postura firme e contrária à anistia não impede que oficiais-generais percebam que as penas impostas pelo Supremo para os envolvidos nos eventos de 8 de Janeiro são excessivamente severas. Conforme relatado pela Folha, a liderança do Congresso está em negociação com o STF para elaborar uma proposta que modifique a Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito, com o intuito de amenizar as penas para aqueles que participaram da depredação na praça dos Três Poderes.
Os comandantes Tomás Paiva (Exército) e Marcos Olsen (Marinha) se reuniram com os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), nos primeiros meses deste ano. Tais encontros foram vistos como visitas de cortesia dos líderes do Congresso aos comandantes militares, após estes terem assumido suas respectivas funções.
Durante a conversa do general Tomás com Hugo Motta no Quartel-General do Exército, a discussão foi formal e não teve uma pauta específica. O comandante do Exército enfatizou que havia projetos de interesse da Força tramitando no Congresso, especialmente uma PEC no Senado que aborda a previsibilidade orçamentária. A questão da falta de recursos também foi tema na reunião do almirante Olsen com Davi Alcolumbre, que visitou a Marinha após a ONU (Organização das Nações Unidas) ter reconhecido a extensão do território marítimo brasileiro na Margem Equatorial. Essa região, próxima ao Amapá, é rica em petróleo e a decisão da ONU garante ao Brasil a soberania sobre a exploração dos recursos naturais nessa área.
O ministro da Defesa, José Mucio Monteiro, afirmou que as Forças Armadas se sentiram desconfortáveis com o progresso das investigações. Segundo ele, o clima de mal-estar aumentou à medida que novas informações sobre militares implicados em conspirações golpistas foram divulgadas.
"O que a Justiça decidir, o que o Legislativo decidir, nós respeitamos. Evidentemente, o militar lamenta muito quando vê um colega indiciado. O primeiro sentimento é de constrangimento, e o segundo é de indignação, porque eles comprometeram a imagem de uma instituição que eles sabem que tem que ser preservada", disse Mucio durante almoço promovido pelo grupo Lide na segunda-feira (5).
A PGR acusou 24 militares de estarem envolvidos em um esquema golpista, sendo que sete deles são oficiais-generais das Forças Armadas, incluindo ex-comandantes como Almir Garnier, da Marinha, e Paulo Sérgio Nogueira, do Exército. Entre os generais de quatro estrelas citados estão Augusto Heleno, Braga Netto e Estevam Theophilo. Embora haja militares de alta patente implicados, o procurador-geral Paulo Gonet declarou que o Exército foi "vítima" dessa trama golpista.
"É de ser observado que o próprio Exército foi vítima da conspirata. A sua participação no golpe foi objeto de constante procura e provocação por parte dos denunciados. Os oficiais generais que resistiram às instâncias dos sediciosos sofreram sistemática e insidiosa campanha pública de ataques pessoais, que foram dirigidos até mesmo a familiares", diz Gonet na denúncia.
Militares de diferentes patentes foram denunciados pela Procuradoria por sua participação no ataque às sedes dos Poderes em 8 de janeiro de 2023. Um deles, o suboficial da reserva Marco Antônio Braga Caldas, da Marinha, foi condenado a 14 anos de prisão.