Energia solar cresce mais do que a demanda e ameaça segurança do setor elétrico, diz ONS
Maior parque de geração de energia solar da América do Sul, em Janaúba (MG). - Eduardo Anizelli/Folhapress O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) voltou a acender o sinal vermelho sobre a segurança do setor elétrico brasileiro diante do crescimento acelerado e desordenado da geração distribuída de energia no país.
No planejamento de médio prazo da operação, divulgado nesta terça-feira (16), o operador avalia que há risco de colapso a partir de 2026, provocado pela dificuldade de reduzir a geração controlável em momentos de alta produção solar combinada com baixa demanda por energia.
Atualmente, a capacidade instalada de micro e minigeração distribuída (MMGD) — painéis solares em telhados e pequenas fazendas solares — já ultrapassa 43 GW, o equivalente a quase 20% da capacidade total de geração de energia do Brasil.
Segundo projeções do próprio ONS, esse número deve chegar a cerca de 65 GW até 2030, respondendo por um quarto de toda a capacidade de geração nacional.
🔌 Episódio recente quase levou o sistema ao colapso
O risco não é apenas teórico. Em 10 de agosto, o excesso de energia quase provocou um colapso no sistema elétrico.
Às 13h05, a geração da MMGD chegou a responder por quase metade da demanda nacional, obrigando o ONS a desligar todas as usinas eólicas e solares de grande porte para evitar sobrecarga no sistema.
Com o crescimento previsto dessa fonte, o operador alerta que o corte da geração centralizada — sobre a qual o ONS tem controle — pode deixar de ser suficiente.
"A expansão da geração distribuída, que atualmente não tem controlabilidade, pode acarretar desequilíbrio entre carga e geração, especialmente em dias de demanda elétrica reduzida"
"Caso nenhuma ação seja tomada, esse desequilíbrio pode comprometer a estabilidade de frequência do SIN [Sistema Interligado Nacional]."
📉 Mais dias de risco nos próximos anos
No planejamento de médio prazo, o ONS estima que a situação pode ficar fora de controle por até sete dias em 2026. Em 2029, esse número sobe para 12 dias.
Uma das alternativas avaliadas é reduzir o uso de usinas térmicas abaixo dos níveis de inflexibilidade contratual, o que ajuda, mas não resolve o problema estrutural.
"Observa-se uma tendência de aumento do número de dias com risco de perda de controlabilidade ao longo do horizonte de estudo, independentemente do despacho da geração térmica, decorrente do fato de a expansão da MMGD superar o crescimento da demanda do sistema"
Segundo o operador, a redução do uso de térmicas garante segurança apenas em 2026, mas os riscos retornam nos anos seguintes.
"Em cenários em que o crescimento da demanda seja inferior ao projetado ou em que a expansão da MMGD mantenha um ritmo acelerado e ultrapasse as previsões"
"os riscos associados podem se elevar de forma significativa".
"Nessas condições, medidas emergenciais, potencialmente mais complexas e onerosas, poderão se tornar recorrentes para assegurar a confiabilidade da operação do SIN."
🏛️ Subsídios, lobby e alternativas em discussão
O ONS alerta desde pelo menos 2024 sobre os riscos da expansão descontrolada da MMGD, beneficiada por subsídios que deveriam ter sido extintos, mas vêm sendo prorrogados por lobbies no Congresso Nacional.
O governo discute algumas medidas para mitigar o problema, como:
Leilões de armazenamento de energia
Implantação de sistemas para permitir o corte da MMGD em cenários de sobreoferta
Adoção de preços horários de eletricidade, incentivando o consumo em períodos de maior geração
Ainda assim, o diagnóstico do ONS indica que isso não será suficiente.
"Será fundamental racionalizar políticas públicas, incentivos e subsídios, de modo que a expansão futura da oferta, sobretudo solar (centralizada e distribuída) não continue avançando em ritmo superior ao crescimento da carga"