Corrida pelo ouro: com preço recorde, joalherias em Nova York enfrentam filas e atraem novos investidores; entenda

As luzes ainda nem estavam acesas na Bullion Exchanges, em Midtown Manhattan, mas uma cliente já esperava do lado de fora, segurando uma sacola amassada da Target com o que acreditava serem tesouros valiosos.
Jennifer Tessler havia vasculhado uma gaveta em busca das joias de ouro de sua mãe, falecida há muitos anos, e de pequenos pingentes de sua pulseira de bebê, que ela guardava havia 77 anos. Decidida a vender as peças, sabia exatamente onde ir: o distrito dos diamantes.
Tessler se juntou a uma verdadeira peregrinação à 47th Street. Frequentadores antigos e novatos buscam lucrar com a disparada do ouro, que atingiu níveis históricos, reflexo da busca de investidores por um porto seguro em meio às incertezas da economia.
O novo frenesi da 47th Street
Há quase um século, o distrito dos diamantes é sinônimo de caos e ansiedade, onde comerciantes, apostadores e curiosos se misturam em meio a joias e metais preciosos. Mas a recente alta do ouro — US$ 4.267,90 a onça (cerca de R$ 24.000) no fechamento desta sexta-feira (17) —, acompanhada pela valorização da prata e da platina, criou um novo tipo de frenesi.
Mais vendedores exibem cartazes de “Compramos ouro” nas calçadas. Há mais maços de notas de cem dólares sendo contados à vista, mais carros blindados descarregando barras metálicas e mais olhares desconfiados, enquanto clientes protegem sacolas com possíveis fortunas.
Situada entre a Quinta e a Sexta Avenidas, cercada por joalherias e negociantes, a Bullion Exchanges tornou-se o epicentro desse movimento. Administrada pelos primos Eric Gozenput e Ben Tseytlin, a loja funciona em um espaço diminuto — “do tamanho de uma cozinha nova-iorquina” — comprando e vendendo barras, moedas e joias de ouro.
Na semana passada, uma barra avaliada em quase US$ 1,5 milhão repousava sobre a balança. Caixas plásticas com colares, brincos e pulseiras se acumulavam no chão, e sacos com anéis de ouro se espalhavam sobre a mesa. O preço em tempo real piscava em uma tela na parede.
Quando as luzes se acenderam, Tessler foi convidada a entrar.
Na época em que ganhou os pingentes — uma raquete de tênis, uma máquina caça-níqueis e um apito de ouro —, a onça custava cerca de US$ 35. Ela também trouxe uma pulseira comprada por sua mãe e um colar de 18 quilates, sua peça mais valiosa. Sem filhos e prestes a viajar a Portugal, decidiu vender tudo.
“Este é o último pedaço de ouro”, disse. “Já dei todo o resto.”
Um funcionário começou os testes de pureza com uma máquina semelhante a um raio X. Enquanto isso, o som das notas sendo contadas na contadora automática enchia o ambiente.
O resultado trouxe uma decepção: o colar não era de ouro. Mas o restante valia US$ 7.338.
“Estou tremendo — não acredito!”, exclamou Tessler. “Acho que vou para casa de limusine.”
Do balcão à fundição
Do lado de fora, a fila crescia. Pessoas com sacolas do Trader Joe’s e do Walmart aguardavam, carregando o peso literal do metal nos bolsos. Joalheiros também se juntavam ao grupo, tentando se livrar de peças encalhadas há anos. Um homem tirou o Rolex do pulso; outro despejou anéis e colares de um envelope acolchoado.
Entre os compradores, havia quem buscasse presentes de ouro para o Diwali, os que se preparavam para um colapso econômico e investidores que viam nas barras do tamanho de uma barra de chocolate um ativo promissor.
Albert Chan foi um deles. Levou dois colares grossos de ouro que recebera como presente de casamento há 20 anos e saiu surpreso: valiam US$ 10.163.
No final da manhã, era hora da fundição. Sanjar Khamraev, funcionário da loja, recolheu o ouro e levou o material ao andar superior, onde alianças, presentes e relíquias familiares eram derretidos em uma lava vermelha. O líquido escorria para moldes de barra, que crepitavam ao esfriar antes de seguir para uma refinaria.
“É caro guardar essas coisas”, explicou Tseytlin. “Você tem que fechar os olhos e jogar tudo no fogo.”
Lucros em tempos de incerteza
A Bullion Exchanges prosperou em momentos de crise. Pandemia, guerra na Ucrânia e o colapso do Silicon Valley Bank impulsionaram o negócio. O mesmo aconteceu quando o governo Trump anunciou o aumento de tarifas.
Para diversificar, a empresa chegou a lançar versões comemorativas: mini waffles dourados Eggo, colheres de prata com Tony, o Tigre, e pequenas peças metálicas com o logotipo “MAGA” e “The Don 45”, em referência a Donald Trump.
O cofre subterrâneo, a 18 metros de profundidade, estava lotado de moedas raras e barras do tamanho de dominós. Câmeras vigiavam cada canto. No piso superior, a tela mostrava o ouro subindo minuto a minuto, aumentando a tensão.
Uma mulher entrou e despejou uma sacola de joias, dizendo que “não queria deixar bagunça para os meus filhos”. Outro homem tentou revender o mesmo ouro falso do dia anterior. Foi dispensado.
Do lado de fora, caminhões blindados iam e vinham, transportando malas de metais tão pesadas que rachavam paletes. Um cliente com óculos Yves Saint Laurent descobriu que sua transferência em Bitcoin falhara. Outro bateu no vidro exigindo entrar.
“Você tem que esperar na fila, meu amigo”, repetia Tseytlin a cada impaciente.
Uma mulher tentou comprar dez barras de uma onça, o equivalente a US$ 41.800, com um cheque.
“Preciso comprar mais hoje!”, gritou, batendo os pés.
“Não, você não pode”, respondeu a funcionária Aviana Wills, temendo um cheque sem fundos.
Às 15h, um homem entrou com um saco de papel, arrancando aplausos: era apenas o almoço.
Perto do fechamento, os últimos clientes chegaram. Um deles trouxe uma barra de ouro de um quilo; o outro, tubos com moedas que tilintaram sobre o balcão. Cada venda valia quase meio milhão de dólares.
Quando o preço do ouro vai parar de subir?, perguntou um deles.
“Isso”, respondeu Tseytlin, “está além de tudo que já vi antes.”