Entenda a crise que mantém os Correios no prejuízo por 12 trimestres

A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos enfrenta uma crise econômico-financeira iniciada em meados de 2022, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, e que persiste na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva.
Desde então, a estatal acumula 12 trimestres consecutivos de prejuízo, registrando um déficit de R$ 4,36 bilhões apenas no primeiro semestre de 2025.
Na última quarta-feira (15), os Correios anunciaram a busca por um empréstimo de R$ 20 bilhões para tentar conter a crise.
Os resultados negativos seguidos resultaram, no ano passado, no primeiro prejuízo bilionário desde 2016, quando a empresa teve perdas de R$ 1,5 bilhão (R$ 2,3 bilhões, corrigidos). Em 2024, o prejuízo alcançou R$ 2,6 bilhões.
Gastos com pessoal
Entre as causas dos prejuízos está o aumento das despesas com pessoal. Em 2022, sob a presidência de Floriano Peixoto Vieira Neto, foram concedidos dois reajustes salariais — um de 9,75% e outro de 10,12% — além de um abono de R$ 1 mil por empregado.
Esses reajustes geraram impacto de R$ 820,5 milhões em 2022 e de R$ 1,3 bilhão em 2023, já na gestão de Fabiano Silva. Em 2024, outro acordo coletivo concedeu até 6,57% de reajuste salarial, elevando a folha em R$ 894 milhões.
No ano seguinte, foi firmado novo acordo com reajuste de 4,11% e gratificação de 70% nas férias, resultando em aumento de R$ 547 milhões no primeiro semestre de 2025.
Além disso, em 2024, os Correios assumiram uma dívida de R$ 2,4 bilhões com a PREVIC, referente ao "Plano de Benefício Definido (PBD)", corrigida pelo INPC em 349 meses, e mais R$ 5,4 bilhões a serem pagos futuramente.
Remessa Conforme
Outro fator agravante foi o programa "Remessa Conforme", criado em 2023 pelo Ministério da Fazenda, que instituiu imposto de 20% sobre compras internacionais de até US$ 50, antes isentas.
A medida, conhecida como “taxa das blusinhas”, permitiu que transportadoras privadas fizessem entregas nacionais, reduzindo o volume de encomendas via Correios.
Um estudo da empresa apontou perda de R$ 2,2 bilhões em receita, com queda de R$ 1,3 bilhão apenas no primeiro semestre de 2025.
Fluxo de caixa
Com aumento das despesas e queda nas receitas, o caixa foi duramente afetado. Em 2023, havia R$ 3,2 bilhões em caixa; ao final de 2024, restavam apenas R$ 249 milhões, redução de 92%.
Para pagar contas, a estatal contraiu empréstimos de R$ 550 milhões junto a bancos privados, com custo de R$ 69 milhões em juros. Em 2025, tomou novo empréstimo de R$ 1,8 bilhão, com juros anuais de 21,99%.
Segundo o presidente Emmanoel Schmidt Rondon, a empresa busca agora um empréstimo de R$ 20 bilhões “para recuperar a liquidez da empresa e garantir o pagamento do Plano de Demissão Voluntária (PDV)”.
Investimentos e precatórios
Mesmo com prejuízos, a estatal investiu R$ 830 milhões em 2024, totalizando R$ 1,6 bilhão desde o início da nova gestão. Foram comprados veículos elétricos, bicicletas e furgões dentro do plano de transição ecológica.
"A sustentabilidade continuará a ser tema central em nosso dia a dia", afirmou a empresa.
Os gastos com precatórios cresceram, chegando a R$ 1,6 bilhão em junho de 2025. Para 2026, a previsão é de R$ 1 bilhão em pagamentos.
Unidades deficitárias e medidas
Apenas 15% das 10.638 agências apresentam superávit. Ainda assim, os Correios garantem o “acesso universal” a todos os municípios.
Em maio de 2025, a empresa anunciou novas medidas: corte de cargos comissionados, PDV, suspensão temporária de férias, venda de imóveis e criação de marketplace próprio.
O plano inclui ainda busca de R$ 3,8 bilhões com o New Development Bank (NDB) e ampliação de parcerias logísticas.
Alternativas
Diante do quadro, a privatização volta a ser debatida. Para o jurista Fernando Vernalha, “deveríamos debater o assunto com mais pragmatismo e com desprendimento ideológico”.
Ele defende uma discussão sobre modelos que conciliem rentabilidade e função pública, nos moldes da concessão da telefonia.