Anistia coloca autoridade de Motta em cheque e tem risco de desgastá-lo com governo e oposição

O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), busca consolidar um acordo sobre a anistia sob a desconfiança tanto da esquerda quanto da direita. O episódio se soma a outros que colocam em teste sua autoridade, constantemente ofuscada pela influência de padrinhos políticos e por sua postura considerada instável entre os interesses de Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PL).
Apesar de gestos ambíguos, Motta tem se alinhado em momentos-chave aos bolsonaristas.
Eleito em fevereiro com o respaldo do PT e do PL, o deputado tenta equilibrar as demandas de ambos os partidos, mas enfrenta a avaliação de que atua sob forte influência do ex-presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e do senador Ciro Nogueira (PP-PI).
Aliados próximos afirmam que essa conduta reflete a desconfiança de Motta em relação a petistas e bolsonaristas, percepção que é recíproca.
A votação do requerimento de urgência que acelerou a tramitação da anistia aos atos golpistas, na quarta-feira (17), exemplifica essa dinâmica.
O PT esperava que Motta articulasse com o Centrão para barrar o requerimento, o que simbolizaria uma derrota política para o bolsonarismo. Governistas, nos bastidores, aceitavam avançar em direção a uma “anistia light”, reduzindo penas, mas sem perdão.
No entanto, Motta deu sinal contrário: permitiu a votação e aprovação do regime de urgência para um projeto de ampla anistia, defendido pelo bolsonarismo e celebrado por aliados de Bolsonaro.
Na prática, seu plano original seguiu adiante, mas petistas criticaram o gesto em favor da direita e alertaram que ele pode perder o controle do processo nas próximas semanas.
Parlamentares também relacionam sua postura à votação da PEC da Blindagem, no dia anterior, quando o PT foi contra o texto e o governo liberou sua bancada. Apesar de parte dos petistas ter sido crucial para manter a previsão de votação secreta em processos contra parlamentares, Motta esperava um gesto mais firme.
Governistas reclamam que esse não foi o primeiro compromisso rompido. Citam, por exemplo, a relatoria da LDO de 2026, prometida ao PT, mas entregue a Gervásio Maia (PSB-PB) após pressão do Centrão.
Há ainda receio de que Motta não cumpra a promessa de apoiar um nome do PT para a próxima vaga no TCU (Tribunal de Contas da União).
Mesmo sob críticas, ele deu andamento ao segundo passo planejado: substituir o projeto original da ampla anistia por um texto intermediário, com redução de penas aos condenados pelos atos de 8 de janeiro, incluindo Bolsonaro.
O relator escolhido, Paulinho da Força (Solidariedade-SP), já afirmou que apresentará um “PL da Dosimetria” de penas, e não um “PL da Anistia”.
O Centrão, liderado por Motta, também firmou discretamente acordo com uma ala do STF para aprovar a redução das penas e abrir caminho para que Bolsonaro cumpra condenação em regime domiciliar.
Mais jovem presidente da Câmara, Motta, de 36 anos, já foi criticado por se alinhar em excesso ao governo, e em outras ocasiões, à oposição.
Entre episódios marcantes estão a votação que derrubou o decreto do IOF de Lula, mesmo após negociações com o Planalto, e o motim bolsonarista que paralisou a Casa, forçando Motta a ceder espaço a Lira na condução da crise.
Tentando demonstrar força, Motta empenhou-se para aprovar a PEC da Blindagem, uma conquista que seus antecessores não alcançaram.
Apesar das aproximações com a direita, aliados avaliam que a tendência é um movimento maior em direção a Lula, especialmente pela eleição na Paraíba.
O apoio do presidente é visto como crucial para a candidatura de Nabor Wanderley (Republicanos-PB), pai de Motta, ao Senado em 2026. Em 2022, Lula venceu com 66,62% no estado, contra 33,38% de Bolsonaro.
Motta tem marcado presença em diversos eventos ao lado de Lula, incluindo o desfile de 7 de Setembro, uma cerimônia do MEC no Planalto e um almoço no Alvorada.
Nesta semana, Lula se reuniu com Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), provável rival de Nabor. O encontro fortaleceu o MDBista, aliado de Lula no Senado, enquanto aliados de Motta tentam isolar Veneziano e garantir apoio presidencial ao prefeito de Patos.
"Tivemos também a oportunidade de dialogar sobre o cenário político nacional e estadual, além de renovar antecipadamente meu agradecimento ao presidente pelo apoio e confiança na nossa reeleição em 2026", escreveu Veneziano nas redes sociais após a reunião.
No pleito para o Senado, Lula já confirmou apoio ao governador João Azevêdo (PSB). Assim, restará apenas uma vaga em disputa.
Integrantes do PT da Paraíba avaliam que, caso Motta se alinhe em excesso ao bolsonarismo, o partido pode não se engajar na campanha de seu pai. Um aliado do presidente da Câmara, entretanto, descarta essa possibilidade, lembrando que o governo depende dele para manter a base parlamentar.