Brics condena ataques contra Irã e preserva Rússia na Guerra da Ucrânia

A declaração final do Brics, obtida pela Folha de S.Paulo, critica ações de Israel na Faixa de Gaza, no Líbano e na Síria, mas evita responsabilizar diretamente Tel Aviv e o governo de Donald Trump pelos ataques recentes ao Irã — mesmo que condene a ofensiva.
O documento também poupa a Rússia de críticas pela Guerra da Ucrânia, ao mesmo tempo em que condena fortemente ações militares de Kiev contra civis e infraestruturas em território russo.
“Condenamos os ataques militares contra a República Islâmica do Irã desde 13 de junho de 2025, que constituem uma violação do direito internacional e da Carta das Nações Unidas.”
A declaração deve ser oficialmente divulgada no domingo (6). Após debates intensos, os negociadores evitaram termos mais duros, como “deploramos”, propostos pelo Irã. Apesar disso, a declaração aponta “violações do direito internacional” e “ataques deliberados” a infraestrutura civil e nuclear do Irã.
O texto menciona sete vezes o termo “Israel” ou “israelense”, mas não cita os Estados Unidos, que participaram das ofensivas. A omissão de Washington reflete uma prática recorrente do bloco, mesmo sob pressão do Irã, China e Rússia.
O Brics optou por repetir elementos de uma nota publicada no final de junho, minimizando os apelos de Teerã por responsabilizações diretas de EUA e Israel. O tom mais equilibrado visa evitar que o grupo seja rotulado como anti-Ocidente ou anti-Trump. Essa moderação foi defendida por Índia, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e também pelo Brasil.
“Reiteramos nosso apoio às iniciativas diplomáticas destinadas a enfrentar os desafios regionais. Conclamamos o Conselho de Segurança das Nações Unidas a se ocupar desta questão.”
A Guerra da Ucrânia praticamente não é mencionada nos 126 parágrafos do documento. No entanto, há condenações específicas a ataques ucranianos contra infraestrutura russa, sem qualquer menção às ações ofensivas da Rússia.
“Condenamos nos termos mais fortes os ataques contra pontes e infraestrutura ferroviária deliberadamente mirando civis nas regiões russas de Briansk, Kursk e Voronej em 31 de maio, 1º e 5 de junho de 2025, resultando em múltiplas mortes de civis, incluindo crianças.”
As negociações da declaração final ocorreram até sábado (5) e enfrentaram dois impasses: a abordagem do conflito entre Irã, Israel e EUA, e a disputa entre Brasil, Egito e Etiópia sobre uma eventual reforma no Conselho de Segurança da ONU.
A ampliação do Brics, com ênfase em países do Oriente Médio, trouxe mais complexidade às decisões do bloco. Segundo avaliação interna do Itamaraty, o crescimento do grupo aumentou o peso geopolítico, mas dificultou o alcance de consensos.
A posição do Irã, novo membro desde 2023, foi vista como isolada e inflexível. Teerã rejeitou incluir no texto qualquer menção à solução de dois Estados (Israel e Palestina), pois entende que isso implicaria reconhecer Israel — algo inadmissível para o regime iraniano desde 1979.
Apesar disso, o texto final mantém a tradição do grupo ao apoiar:
“a adesão plena do Estado da Palestina às Nações Unidas no contexto do compromisso inabalável com a solução de dois Estados.”
Todos os outros países, inclusive as nações árabes Egito e Emirados Árabes Unidos, apoiaram essa formulação. Segundo um negociador, trata-se de uma posição amplamente compartilhada pelo Sul Global, sem possibilidade de recuo para atender à demanda isolada do Irã.