Catador de lixo

Hoje, 07 de junho, é Dia Estadual do Catador de Material Reciclável!

Na paisagem e no quadro do nosso incontornável colapso urbano, esse é dia dos mais significativos e importantes para todos nós e que vivemos nisso e que insistimos em tratar como _cidade_ .

O catador/catadora é esse indivíduo absolutamente definitivo e central para conter ou quem sabe, mitigar o incontrolável "dragão" da produção de lixo e que arrasa com bairros, setores e regiões urbanas inteiras. 

Lixo nem é lixo! 

Este, repara bem, se enfilera ao lado de dramas urbanos como a violência, a falta de moradia ou a insuficiência de serviços públicos e básicos como das maiores incógnitas a determinar o profundo _status_ de degradação do urbano, de seus conteúdos e das relações daí advindas. 

Sim... É que cidades e sua larga combinação de contradições refunda civilizações, propostas sociais e societárias e ideais superiores de uma vida integrada, coesa e plena.

É que a cidade está também, em mim, na minha pele, nos meus olhos, sensações, percepções e formas de ser e estar. A cidade está e é objetividade, subjetividade, medo, sentido, sentimento, adoecimento, tesão, desejo, repulsa, agonia e gozo... E por fim... Cidade não se define! Porque é um tudo e que não se filia a sínteses. 

Pois bem, a cidade moderna é um _topos_ de dor, violência, desamparo e resistências e é claro, está aí, visível, aberta e nos provando de que esta cidade diária, cotidiana e do capital não dialoga com utopias, não permite romances ou idealismos pueris acerca daquilo que a rege, governa e determina: a mercadoria. 

Catadores e catadoras são, em si, políticas públicas de carne, osso, sensibilidades e em pleno movimento, em ativa dinâmica e em inconcluso processo. 

É estranho mas... O singelo gesto de apanhar uma garrafa "pet", um papelão ou uma lata de alumínio e acondicionar esses descartáveis de forma ordenada, higiênica e segura é carinho no asfalto quente e duro, é afago na periferia policiada, é zelo na insuportável relação centro/periferia. 

A classificação disso que descartamos com velocidade hipersônica e irracional é o revés, o contrário do gesto vil, desurbano, anti-urbano e anti-social. 

O catador ou catadora, normalmente pessoa negra, de baixa formação escolar, morador do gueto, da margem e do arrabalde da cidade é a prova de que a periferia apresenta-se com imensa dignidade ante às altas ondas de desordenação da vida urbana; é oferenda de labor e produção às moendas sociais e societárias da nossa tremenda vida nesse conglomerado e que desmorona ante aos nossos olhos atônitos. 

A barbárie nos governa, catadores propõem solidariedade e meio ambiente; a cidade se ergue furiosa, os trabalhadores da catação ofertam um futuro possível; a floresta arde em brasas, o beija-flor insiste, gota a gota, em conter o terror de fogo. 

Isso... Catadores são beija-fores!

Nesse sentido, atenção, o consumo vira violência! É fácil de identificar... O consumo nesses tempos, é violação do outro; o consumo dos abastados, sobretudo, destes, é arma política e simbólica que afirma e reafirma posições, que educa olhares e sensações e que, ao fim, mostra quem é quem, "quem manda". 

Consumo é arma, violência e expressão de poder... O consumismo é o adoecimento do consumo; é o consumo como ideia, ideologia, como visão torta e equivocada do real a ser acionado, mobilizado, apropriado e claro, consumido.

Nessas imensas "ollas" de consumo resta, nos resta o refugo a ser conduzido, tratado e administrado. Sim... Há a possibilidade de gestão para o caos. 

Catadores provam isso!

Nesse dia... Um brinde, um trago e um porre de alegrias e homenagens para esses seres humanos imensos e que com seus corpos pretos e mestiços, se interpõem ao avanço do inferno e que se atreve a chegar às nossas salas. 

Saudações!

_Angelo Cavalcante_ - Economista, professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Itumbiara.