Fachin cria órgão para fiscalizar transparência e riscos de corrupção no Judiciário

Em uma das primeiras ações de sua gestão, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Edson Fachin, criou um órgão para “identificar e prevenir riscos de corrupção, conflitos de interesse, captura institucional e outras ameaças à independência e à imparcialidade da Justiça”.
De acordo com portaria assinada na última segunda-feira (29), o Observatório Nacional da Integridade e Transparência do Poder Judiciário terá a função de “monitorar e fortalecer a integridade, a ética pública, a governança e a transparência do Poder Judiciário, por meio de produção de indicadores, gestão de riscos, formulação de políticas baseadas em evidências, difusão de dados e cooperação nacional e internacional”.
Em seu discurso de posse, Fachin ressaltou que “transparência é a chave quanto às modalidades de remuneração”.
O órgão será vinculado ao CNJ, responsável por fiscalizar a atuação de juízes de todo o país, e produzirá relatórios, documentos e pesquisas para melhorar a eficiência do Judiciário.
Por exemplo, caso o observatório identifique que um tribunal não divulga em seu site dados como a remuneração de magistrados, o comitê poderá analisar a situação e solicitar medidas para que a Lei de Acesso à Informação seja cumprida.
Se houver proximidade suspeita entre um juiz e alguma das partes de um processo, o observatório poderá emitir um “alerta”, com recomendações para que o magistrado se afaste do caso.
A analogia nos bastidores é com a atuação do Tribunal de Contas da União (TCU), que já emitiu alertas ao Executivo sobre o risco de não cumprir metas fiscais.
“Não é uma caça às bruxas. A ideia do observatório não é ser um órgão punitivista, é compliance, com normas de adequação. Se trata de corrigir rumos e rotas”, afirmou uma fonte próxima às discussões.
Revisão de políticas
O observatório será formado por Fachin e conselheiros do CNJ, contando ainda com um comitê de cinco representantes da sociedade civil, quatro magistrados das justiças estadual, federal e do trabalho, e um integrante indicado pela corregedoria nacional do CNJ.
A maioria dos membros será da sociedade civil, tentando reduzir qualquer viés corporativista — embora juízes façam parte do grupo.
Os integrantes devem ser escolhidos nas próximas semanas, e o órgão será instalado antes do recesso do Judiciário, que começa em 20 de dezembro.
‘Dever de dar o exemplo’
A cultura da transparência enfrenta resistência até mesmo no Supremo.
Fachin é um dos poucos ministros que divulga diariamente sua agenda no gabinete — algo que a maioria prefere omitir.
Além disso, o tribunal não costuma informar viagens e palestras de ministros no Brasil e no exterior, nem esclarecer quem custeou essas despesas. O foco do observatório será em tribunais de instâncias inferiores, pois o CNJ não pode investigar o STF.
Fachin ainda não indicou se pretende mudar políticas de transparência de viagens e palestras da Corte. O tema é sensível, já que ministros não têm subordinação hierárquica à presidência do STF. Tentativas de criar um código de ética para a Corte resultaram em silêncio por parte dos magistrados.
Nos últimos meses, o ex-relator da Lava-Jato deu sinais de sua gestão. Em artigo no site “Jota”, Fachin escreveu que “magistrado algum está acima da legalidade constitucional” e frisou que “se a magistratura não chamar para si o dever de dar o exemplo pelo comportamento teremos irremediavelmente falhado”.
Fachin também nunca participou do Fórum Jurídico de Lisboa, o “Gilmarpalooza”, evento do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), ligado ao ministro Gilmar Mendes, que reúne políticos, empresários, lobistas e integrantes da Corte na capital portuguesa, com debates, painéis, jantares e festas paralelas.
Em junho do ano passado, enquanto colegas participavam do evento e não esclareciam quem custeou suas despesas, Fachin afirmou em palestra no STF que “comedimento e compostura são deveres éticos, cujo descumprimento solapa a legitimidade do exercício da função judicante [de julgar]”. O recado foi claro, embora sem citar nomes.