Luto por suicídio ainda enfrenta estigma e falta de acolhimento social

Neste mês, a campanha do Setembro Amarelo ganha destaque na mídia e nas redes sociais ao tratar da prevenção ao suicídio. O debate ajuda a reduzir o estigma e o tabu em torno do tema, mas também enfrenta críticas por, em alguns casos, gerar sofrimento.
O preconceito ainda marca a percepção sobre suicídio na sociedade. Um levantamento de 2023 apontou que pelo menos 20 países penalizam pessoas que tentaram suicídio, e algumas religiões, como o cristianismo, condenam a prática. Isso leva muitos a manter silêncio, dificultando a busca por ajuda.
Para Daniela Reis, psicóloga especialista em trauma, luto e prevenção ao suicídio, é essencial olhar também para famílias enlutadas, oferecendo acolhimento e informações que desmistifiquem o tema.
A pesquisadora Daniela Tonellotto, que perdeu o filho Andreus em 2022, relata que demorou meses para falar sobre a morte dele, mesmo na terapia. Ela encontrou na escrita uma forma de organizar o luto, o que a ajudou a superar a vergonha e o medo do julgamento. Inspirada por essa experiência, lançou o livro Entre Parênteses, compartilhando sua história para ajudar outras famílias em luto.
Maria Júlia Kovács, coordenadora do Laboratório de Estudos sobre a Morte da USP, destaca que a culpa é uma característica marcante do luto por suicídio. Muitos se culpam por não terem evitado a morte, mesmo quando isso não era possível. Segundo ela, ouvir relatos sem julgamentos e validar experiências é fundamental para o acolhimento.
Karen Scavacini, psicóloga e especialista em prevenção e pósvenção do suicídio, reforça que falar sobre o tema pode ajudar pessoas em sofrimento e reduzir tentativas de suicídio, desde que feito com responsabilidade. Histórias que detalham métodos ou atribuem a causa a um único fator podem gerar o chamado “suicídio de contágio”, enquanto relatos de superação e busca de ajuda produzem efeito positivo, conhecido como efeito Papageno.
O Setembro Amarelo, apesar de importante, pode gerar pressão sobre enlutados ao reforçar a ideia de que todo suicídio é prevenível. Para Kovács, ações pontuais, que incluam cuidado contínuo com saúde mental, prevenção e pósvenção, seriam mais eficazes do que campanhas concentradas em um único mês.
Scavacini enfatiza que não há palavras perfeitas para lidar com o tema, mas a escuta atenta, sem preconceito e sem pressa, é muitas vezes mais valiosa do que qualquer campanha ou frase de efeito.