Pioneiras da Psicanálise Ganham Vida nas Telas com Virgínia e Adelaide

O cinema brasileiro estreia uma obra que resgata o papel essencial de duas pioneiras da psicanálise nacional. O filme Virgínia e Adelaide, com direção de Yasmin Thayná e Jorge Furtado, apresenta uma narrativa ficcional baseada na trajetória transformadora de Virgínia Leone Bicudo e Adelaide Koch — duas mulheres que enfrentaram barreiras sociais, raciais e culturais para influenciar profundamente a compreensão da mente humana no Brasil.
As protagonistas, interpretadas por Gabriela Correa (Virgínia) e Sophie Charlotte (Adelaide), se conhecem em 1937. Virgínia, uma socióloga negra em início de carreira como psicanalista, inicia sua análise com Adelaide, médica judia que fugiu do regime nazista. A relação terapêutica entre as duas dá lugar a uma amizade e parceria profissional que durou mais de trinta anos.
O filme destaca a importância histórica desse encontro e amplia o debate sobre as contribuições femininas à psicanálise. “A gente precisa contar mais as nossas histórias, das nossas heroínas, que tanto resistiram e construíram esse país de tantas formas. A psicanálise é uma dessas formas”, afirma Sophie Charlotte, ressaltando a relevância de tornar a história acessível a um público mais amplo. “É realmente fazer com que a história rompa uma bolha. Divulgar a história de duas mulheres incríveis é fundamental”, complementa.
Virgínia Bicudo não apenas quebrou paradigmas na medicina e na psicanálise, como também produziu estudos pioneiros sobre racismo estrutural no Brasil. O primeiro material acessado por Yasmin Thayná, durante a fase de pesquisa do longa, foi justamente uma obra de Virgínia sobre a percepção de pessoas negras a respeito de si mesmas.
Gabriela Correa relata que os trabalhos de Virgínia sobre colorismo, identidade racial e mobilidade social ecoaram em sua vivência pessoal e na construção da personagem: “Senti que ela, assim como eu, soube o que é transitar em espaços majoritariamente brancos, e questionar afinal o que ela era, onde ela se encaixava, suas origens, uma vez que ela descendia de pai negro e mãe branca. Esse não-lugar, a violência da vergonha e do não-pertencimento, do auto-ódio, tudo isso é algo que experimentei em alguma medida na minha vida”.
A preparação das atrizes incluiu ensaios e discussões aprofundadas sobre o roteiro. “A gente se reunia para ler o roteiro. Não é muito comum, pelo menos na minha experiência, que a gente tenha um trabalho tão profundo de dramaturgia”, diz Gabriela. Ela ainda compartilha um conselho que recebeu durante os ensaios: “Falou uma coisa que sempre ficou comigo, que tudo está no roteiro, todas as respostas que os atores precisam”.
Com estreia marcada para esta quinta-feira (8/5), o longa tem produção de Nora Goulart. Jorge Furtado explica que o objetivo não é biografar completamente as personagens, mas provocar interesse sobre suas trajetórias. “A importância é ativar a curiosidade das pessoas, porque o filme não é uma vida, é só 1h30. As pessoas podem ver o filme e pensar ‘preciso saber mais sobre essas mulheres’”, comenta. “A vida da Virgínia é muito ampla, ela fez muito mais coisa do que a gente consegue contar”.
A produtora Nora Goulart também valoriza o alcance da obra. “É uma história linda dessas duas, e a gente queria muito que o filme fosse visto por muitas mulheres”. Para Yasmin, o encontro entre Virgínia e Adelaide representa uma força que atravessa gerações: “É uma mensagem positiva de que os nossos encontros são muito potentes e que o encontro da Virgínia e da Adelaide é um entre muitos que deram certo. Se a gente for olhar a história, tem muitos encontros importantes, que nos continuem quanto pessoa”, afirma.