PF revela que PL ocultou parecer que negava fraudes em urnas eletrônicas para justificar golpe de Estado
Sob a liderança de Valdemar Costa Neto, o Partido Liberal (PL) possuía um parecer técnico que desmentia a existência de fraudes nas urnas eletrônicas. Mesmo assim, decidiu contestar judicialmente o resultado do segundo turno das eleições de 2022, quando o então presidente Jair Bolsonaro (PL) não conseguiu se reeleger.
Esse parecer foi elaborado pela Gaio Innotech Ltda, empresa do estatístico Éder Lindsay Magalhães Balbino, conhecido como “o gênio de Uberlândia” por Valdemar. A Gaio Innotech foi contratada pelo Instituto Voto Legal (IVL), que, por sua vez, recebeu R$ 1,5 milhão diretamente do PL para realizar um estudo sobre as urnas eletrônicas brasileiras.
Entretanto, o presidente do IVL, Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, optou por ocultar os dados apresentados por Éder Balbino e alterou o relatório final que foi submetido pelo PL à Justiça Eleitoral, com o intuito de apoiar a alegação de fraude.
De acordo com a Polícia Federal, tanto Carlos Rocha quanto Valdemar Costa Neto e Jair Bolsonaro agiram “de forma dolosa” ao persistirem na contestação formal do resultado das eleições perante o TSE. Os investigados, mesmo cientes das baixas chances de sucesso, adotaram essa estratégia como parte de uma tentativa de golpe de Estado em andamento.
Essas conclusões estão contidas no relatório final da PF, que indiciou 37 pessoas, incluindo Valdemar, Bolsonaro e Carlos Rocha, por crimes como abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa. O sigilo do relatório foi levantado na última quarta-feira (26/11) pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes.
PL contesta resultados das urnas em 2022
Em 22 de novembro de 2022, o Partido Liberal (PL) protocolou uma “Representação Eleitoral para Verificação Extraordinária” junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), visando anular os votos do pleito.
Na ocasião, Valdemar Costa Neto e o presidente do Instituto Voto Legal (IVL) realizaram uma coletiva de imprensa. O então presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, rejeitou o pedido e impôs uma multa de quase R$ 23 milhões ao partido de Bolsonaro por litigância de má-fé.
O pagamento ao IVL
Entre 2022 e 2023, o PL transferiu R$ 1,5 milhão ao Instituto Voto Legal. A Polícia Federal revelou que o IVL contratou a empresa de Éder Balbino por R$ 13 mil para realizar a análise dos dados das urnas.
De acordo com a Polícia Federal, Carlos Rocha, do IVL, divulgou informações que eram “diametralmente opostas ao entendimento” de Éder Balbino sobre o que poderia ser considerado “a verdade factual”. O estatístico mineiro não concordava com o relatório e rejeitava as alegações de fraude nas eleições de 2022, defendidas por Carlos Rocha, Bolsonaro e Valdemar Costa Neto.
“Ou seja, mesmo com expressa recomendação do representante da empresa Gaio Innotech de retificação de trechos do relatório produzido pelo IVL, que embasou a representação do Partido Liberal, a retificação não só não foi efetuada, mas também Carlos Rocha fez declarações, em coletiva de imprensa do PL, difundindo aquilo que já se sabia falso”, destacou a Polícia Federal.
Éder Balbino não foi indiciado pela Polícia Federal, apesar de ter sido alvo de uma operação da corporação em fevereiro deste ano. Na ocasião, ele prestou depoimento e forneceu detalhes sobre o trabalho que realizava para o IVL. Balbino afirmou aos investigadores que não acreditava na existência de qualquer tipo de fraude nas urnas eletrônicas brasileiras.
Trecho do depoimento de Baldino; Reprodução
Demanda de Valdemar
De acordo com a Polícia Federal, Valdemar Costa Neto solicitava diretamente aos prestadores de serviço que buscassem indícios de fraudes nas eleições. Nesse contexto, o presidente do PL enviou dados das urnas do segundo turno das eleições a Carlos Rocha e Éder, questionando se eles conseguiriam encontrar alguma evidência.
“As trocas de mensagens evidenciam que Valdemar gerou demandas diretamente para Éder e que o objeto das conversas e trocas de mensagens são relacionadas às buscas por indícios de fraudes nas eleições, confirmando a atuação direta de Valdemar na propagação de informações falsas sobre as urnas eletrônicas”.
Segundo a PF, Jair Bolsonaro e Valdemar Costa Neto tinham conhecimento que o PL e o IVL abasteciam influenciadores digitais com informações falsas sobre as urnas eletrônicas e o processo eleitoral brasileiro.
Entre os influenciadores que eram municiados com informações falsas, estão o empresário e marqueteiro argentino, Fernando Cerimedo, que fez uma live em novembro de 2022 atacando o sistema eleitoral do Brasil. Ele também foi indiciado pela PF. Cerimedo é o mesmo estrategista da campanha vitoriosa de Javier Milei nas eleições de 2023.
O que a PF descobriu
A PF descobriu uma trama golpista visando impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do vice dele, Geraldo Alckmin (PSB), ao término das eleições presidenciais de 2022, quando o então presidente Jair Bolsonaro (PL) perdeu o pleito.
O plano previa, inclusive, o assassinato de Lula, Alckmim e Moraes. A partir da quebra de sigilo telefônico e telemático de aparelhos celulares e computadores, a PF encontrou áudios e conversas em que os investigados tramam o golpe de Estado.
PF Divide Indiciados em Seis Núcleos de Golpe de Estado
As investigações da Polícia Federal revelaram que os 37 indiciados se organizaram em uma estrutura com divisão de tarefas, resultando nos seguintes grupos:
a) Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral
Integrantes:
Mauro Cesar Barbosa Cid, Anderson Torres, Angelo Martins Denicoli, Fernando Cerimedo, Éder Lindsay Magalhães Balbino, Hélio Ferreira Lima, Guilherme Marques Almeida, Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros e Tércio Arnaud Tomaz.
b) Núcleo Responsável por Incitar Militares a Aderirem ao Golpe de Estado
Integrantes:
Walter Souza Braga Netto, Paulo Renato de Oliveira Figueiredo Filho, Ailton Gonçalves Moraes Barros, Bernardo Romão Correa Neto e Mauro Cesar Barbosa Cid.
c) Núcleo Jurídico
Integrantes:
Filipe Garcia Martins Pereira, Anderson Gustavo Torres, Amauri Feres Saad, José Eduardo de Oliveira e Silva e Mauro Cesar Barbosa Cid.
d) Núcleo Operacional de Apoio às Ações Golpistas
Integrantes:
Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros, Bernardo Romão Correa Neto, Hélio Ferreira Lima, Rafael Martins de Oliveira, Alex de Araújo Rodrigues e Cleverson Ney Magalhães.
e) Núcleo de Inteligência Paralela
Integrantes:
Augusto Heleno Ribeiro Pereira, Marcelo Costa Câmara e Mauro Cesar Barbosa Cid.
f) Núcleo de Oficiais de Alta Patente com Influência e Apoio a Outros Núcleos
Integrantes:
Walter Souza Braga Netto, Almir Garnier Santos, Mario Fernandes, Estevam Theophilo Gaspar de Oliveira, Laércio Vergílio e Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira.